O embaixador aposentado Flávio Perri, que coordenou a
Rio 92 - a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
- disse que uma das principais diferenças entre o encontro e a nova Conferência
da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que ocorrerá em junho
próximo no Rio, é que àquela época não havia uma mobilização popular como
existe atualmente.
Agência Brasil
“A característica da Rio+20 é que não são apenas os
governos, os presidentes e chefes de Estado que vão participar e assinar
um documento principal. É toda a opinião pública”. Ele destacou que, pela
primeira vez, o evento será transmitido em tempo real pela internet para todo o
mundo. “Milhões de pessoas vão ver o que se passa no Rio”. Essa distinção é
muito importante, disse Perri, porque dá uma característica participativa à
Rio+20.
Outra diferença entre as duas conferências, segundo o
diplomata, é que não havia, em 1992, o conceito de desenvolvimento sustentável
como existe hoje. Ele lembrou que esse conceito foi enunciado pela primeira vez
no Relatório Brundtland, resultado de uma comissão independente constituída sob
o comando da ONU e chefiada pela primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem
Brundtland. Apresentado em 1987, o relatório Nosso Futuro Comum propõe o
desenvolvimento sustentável, que “atende às necessidades do presente sem
comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas
necessidades”.
“Foi a primeira vez que a comunidade internacional admitiu
esse conceito”, observou Perri, acrescentando que ele se consagrou na Rio 92.
Segundo o diplomata, pela primeira vez esse conceito “qualificou o substantivo
desenvolvimento com o adjetivo sustentável e não reduziu a perspectiva de
desenvolvimento”. Ele explicou que, ao contrário, deu mais segurança ao
processo de desenvolvimento, “para que ele se mantenha contínuo e permita que
sejam produzidos bens que tragam bem-estar e vida digna para os seres humanos”.
Perri deixou claro, porém, que o conceito de
desenvolvimento sustentável necessita do planeta e de tudo que ele possa
fornecer para ser transformado em bens. “O desenvolvimento depende do planeta.
E para que ele continue verdadeiro e contínuo, é preciso que haja a
sustentabilidade dos insumos que oferece”.
O embaixador aposentado destacou que a conferência Rio+20
já parte desse conceito, que é bem aceito e reconhecido pela opinião pública e
objeto de interesse de governos, empresas, indivíduos e grupos sociais.
Outra diferença é que a Rio 92, também chamada Cúpula da
Terra, vinha negociar uma agenda com foco preciso. Chefes de Estado de todo o
mundo foram ao Rio naquele ano para negociar os tratados sobre biodiversidade e
clima e a Agenda 21, que Perri definiu como um modelo de convivência humana e
de governabilidade firmado em 1992. “A meu ver, esse é um instrumento central,
resultante da Rio 92”.
Ele comentou que a Rio+20, ao contrário, foi convocada
“sem que houvesse uma linha de chegada, como havia na outra (conferência)”.
Referiu-se a uma negociação que resulte na assinatura de um tratado específico.
Segundo Flávio Perri, o que a Rio+20 terá é uma declaração, que poderá ser
muito importante se indicar novos rumos para o desenvolvimento sustentável “até
o fim do século ou além”.
O coordenador da Rio 92 avaliou que o rascunho da
conferência, chamado documento zero, foi produzido a partir de sugestões
dos governos e está ainda recebendo indicações informais a respeito desse novo
rumo de desenvolvimento que deve ser seguido pelas nações. “É uma nova forma de
encarar o processo de desenvolvimento, que deve ser sustentável, respeitando os
bens oferecidos pelo planeta como insumos para a produção”.
Perri deixou claro, entretanto, que a conferência não pode
decidir as modificações, mas somente indicar o caminho, de maneira que a
produção condicione um consumo também diferenciado. “Esse é um ponto essencial
na percepção do que poderá vir da conferência. É uma revisão dos métodos de
produção, dos critérios para qualificá-la e também do consumo”. Para o
coordenador da Rio 92, a nova conferência da ONU tem de estabelecer um patamar
que torne possível a sobrevivência do planeta, que tem hoje cerca de 7 bilhões
de habitantes.
Ele disse que ao reconhecer e respeitar os limites
do planeta, será mais fácil balizar a produção que devemos ou podemos tirar, em
termos de bens e insumos oferecidos, para a nossa sobrevivência. “O que não é
justo é que continuemos a explorar os insumos do planeta – minerais, animais e
vegetais – em prejuízo de futuras gerações”, advertiu.
Esse é o novo modelo de ver a organização da sociedade.
Isso significa também, apontou Perri, novas maneiras de articular as atividades
dentro da sociedade, partindo dos governos e enviando mensagens à ação social.
“Por aí, vamos chegar talvez a um documento que poderá ter impacto e que irá
encerrar a conferência”.
Flavio Perri aposentou-se da diplomacia em 2009.
Atualmente, é membro da Sociedade Nacional de Agricultura e da Academia
Nacional de Agricultura.
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