Por Leide Franco (@LeideFranco)
Vivo
em uma batalha diária comigo mesma. Eu olho para mim e ordeno: Leide, não
endureça... mais! É uma luta de mim para comigo mesma para não perder toda a
bobice que faz uma pessoa melhor. A briga é para que a injustiça, a inveja e a
falta de respeito soltos em toda parte não me façam perder de vista os lados
opostos desses males enraizados no solo desertificado de muita gente. Tem dias
que você olha para o mundo, e na tentativa de ficar mais esperto, deixa de
acreditar nas boas intenções, passa a enxergar nelas um interesse calculado,
escondido por traz dos bons atos.
As
pessoas estão se especializando em rasteira, aquele golpe que derruba, tirando
você do chão inesperadamente. Quase todos são suspeitos. Confiança? Nem na própria
sombra. Vemos gente andando olhando para os lados, como se a qualquer momento
pudesse ser atacado por um mais esperto que eles. O mundo está virando lugar
dos espertos.
Por
isso minha luta é para que eu me permita ser boba. Ser boba tem lá suas
vantagens, já disse Clarice Lispector:
O
bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o
mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se
perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou
pensando."
Ser
bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de
sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem
a idéia.
O
bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão
sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e
estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria
para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é
um Dostoievski.
Há
desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um
desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o
aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é
fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não
funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão
estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em
contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto
estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser
ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que
venceu.
Aviso:
não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem
menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo
a célebre frase: "Até tu, Brutus?"
Bobo
não reclama. Em compensação, como exclama!
O
bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser
bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os
espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em
compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem
que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.
Há
lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com
burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah,
quantos perdem por não nascer em Minas!
Bobo
é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível
evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de
amor. E só o amor faz o bobo.
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