O Brasil está muito atrasado em relação a outros países
quando o assunto é implementação de políticas de regulação no campo da
publicidade infantil. A avaliação é da professora do Programa de Pós-Graduação
em Comunicação da Universidade Federal do Ceará (UFC), Inês Vitorino, que
coordena o grupo de pesquisa da relação infância, adolescência e mídia da
instituição.
Thais Leitão
- Agência Brasil
A especialista, que também é doutora em ciências sociais
pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita que é preciso haver
maior reflexão e mobilização da sociedade brasileira para exigir leis que
protejam crianças e adolescentes dos “efeitos nocivos” que o marketing
direcionado a eles tem. “As propagandas voltadas para crianças são em geral
abusivas porque utilizam estratégias de persuasão que elas não são capazes de
identificar, então estão sendo enganadas”, disse.
Inês Vitorino acredita que o Brasil deve seguir o exemplo
de países que adotaram modelos que proíbem a publicidade infantil ou
regulamentam a atividade de forma específica. “Na Alemanha, por exemplo, toda a
publicidade é dirigida aos pais e nos horários infantis não há qualquer
publicidade. Na província do Québec, no Canadá, e na Suécia, a publicidade
infantil é inteiramente proibida. São países de tradição democrática, mas
optaram por esse caminho com base no princípio norteador que a criança até 7 ou
8 anos não tem sequer a clareza do conteúdo persuasivo. Ela assiste à
publicidade e não tem compreensão de que ali há uma oferta de venda”, explicou.
A especialista ressaltou, ainda, que por meio da
publicidade são apresentados conceitos e valores, como níveis de competitividade
e desqualificação de pessoas pela falta de posse de determinados produtos, com
os quais a criança não está preparada para lidar. “Sem maturidade para lidar
com esse tipo de situação, a criança sofre problemas de autoestima e conflitos
familiares, porque ela passa a pedir aos pais coisas que muitos deles não têm
condições de comprar”, ressaltou.
A professora da UFC citou ainda outra situação considerada
por ela um problema familiar, que é a influência de crianças e adolescentes nas
compras da casa. De acordo com ela, dados colhidos por um instituto de pesquisa
brasileiro, em 2007, constataram que, no Brasil, 45% de crianças e adolescentes
entre 8 e 14 anos opinam sobre a compra de carros pela família, 60% influem
sobre a aquisição de celulares e 61% sobre a de computadores. Em consequência,
a consultoria concluiu que 80% das marcas devem incluir o público formado por
crianças e adolescentes nas suas estratégias de marketing.
Inês Vitorino acredita que o Brasil precisa ter uma
“regulamentação que defina limites à intervenção publicitária”. “Atualmente
quem mais atua nessa área é o Conar [Conselho Nacional de Autorregulamentação
Publicitária], mas por se tratar de um órgão privado de autorregulamentação,
seu código não tem força de lei e ele não tem poder para garantir punições mais
severas”, disse.
Ela ressaltou que além da autorregulamentação, existe o
controle social exercido por organizações da sociedade civil, como o Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e a Agência de Notícias do Direito da
Infância (Andi). A professora destacou que com a ausência de regulamentação
específica, desde a década de 1990 outros aparatos legais tentam suprir essa
lacuna e definir limites na comunicação comercial, como o Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), o Código de Defesa do Consumidor e a Lei nº 9.294/96 que
regula publicidades de produtos nocivos.
Ela citou ainda o Projeto de Lei 5.921/01, que tramita há
mais dez anos no Congresso Nacional e proíbe a publicidade dirigida à criança e
regulamenta a publicidade dirigida a adolescentes. O texto, que inicialmente
foi proposto pelo deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) e já sofreu
diversas alterações, está sob apreciação da Comissão de Ciência e Tecnologia,
Comunicação e Informática (CCTCI ), da Casa Legislativa. A proposta tem
resistência de diversos setores ligados à publicidade, além de fabricantes de
produtos infantis.
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