O menino, filho do rico fazendeiro da região do cacau,
que foge do colégio, torna-se repórter de polícia aos 14 anos, aprende a viver
nos bordéis e nos botequins do porto da Cidade da Bahia, foi um escritor de seu
povo.
Por Mauro Santayana, em seu blog
Ser escritor de um povo não é só contar suas estórias,
belas ou tristes. É mais do que criar estilos literários, realizar experiências
lingüísticas, apelar para metáforas inusitadas. Ser um grande escritor de seu
povo, como foi Michael Gold, com Judeus sem Dinheiro; John dos Passos, com
Manhattan Transfer; Steinbeck, com Vinhas da Ira; Ferreira de Castro, com A lã
e a neve; Érico Veríssimo, com O Tempo e o Vento, e Tolstoi, com Guerra e Paz –
entre tantos outros - é incorporar na alma todos os sentimentos, bons e maus,
de seus conterrâneos, no momento da recriação literária. É vivê-los nas próprias
vísceras, participar de seus sofrimentos, acreditar em seus deuses e
acompanha-los no momento da morte.
Jorge Amado foi o escritor da Bahia, da Bahia que dera nascimento
ao Brasil e à sua literatura com o gênio cáustico de Gregório de Mattos Guerra;
da Bahia que consolidou a independência, com a gesta heróica de 2 de Julho; da
Bahia do irredentismo da Revolução dos Alfaiates. E, por isso mesmo, um
brasileiro.
É velha a discussão entre a literatura e a política. Toda
literatura - como os poemas e peças teatrais gregas - trata das relações entre
os seres humanos, todas elas condicionadas pelas tensões do poder. A obra literária
é sempre política. É assim que podem ser lidos os textos de Guimarães Rosa,
inspirados, como se sabe, pelos relatórios da Polícia Militar de Minas, antiga
Força Pública. Ao escrever seu excelente ensaio sobre o Rio São Francisco,
Marco Antonio Coelho trata do assunto, ao identificar um dos personagens fortes
de Grande Sertão:Veredas, o enigmático Zé Bebelo, vencido, na ficção, pela
ousadia de Riobaldo. Guimarães se baseou na vida real do “coronel” Rotílio
Manduca, chefe político e responsável, conforme a lenda, pela morte de mais de
duzentos inimigos, no Vale do São Francisco.
Jorge Amado foi um grande militante político. Ao eleger-se
deputado federal pelo Partido Comunista apresentou projetos de lei como o da
efetiva liberdade religiosa – ele que era rigorosamente ateu, ainda que
acolhido nos terreiros de candomblé. Dele tenho a memória de um forte convívio,
no Brasil e no Exterior. Fomos membros da Comissão de Estudos Constitucionais,
que elaborou o anteprojeto da Constituição de 1988 e ali sempre coincidimos em
nossas posições.
Ele se orgulhava de que o definissem como “o romancista
das prostitutas e dos vagabundos”. Ele sempre foi o romancista do povo pobre,
explorado e oprimido de nosso país.
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