As
coisas não se definem apenas pela personalidade ou por convicções dos líderes.
As circunstâncias históricas moldam as ações de quem comanda. Mas que o
indivíduo tem um papel na História, isso tem.
Blog
do Alon
O
futuro da indústria brasileira é ponto de tensão entre economistas. Uns a
consideram condenada, pela desvantagem competitiva diante de países com mão de
obra abundante e barata. Outro defendem que não há como uma nação do tipo do
Brasil alcançar a plena realização sem reconhecer papel central no setor.
A
História brasileira registra a presença permanente de traços
anti-industrializantes. Desde a colônia, quando manufaturas eram
criminalizadas. Passando pelo Império, que levou um século quase inteiro para
abolir a escravidão e nunca chegou a fazer a reforma agrária. Chegando à
República, que na primeira fase (Velha) se limitou a estender no tempo o poder
das oligarquias agrárias.
Aí
veio Getúlio Vargas, e o Estado começou a arrastar a sociedade pelos cabelos
rumo à industrialização forçada. Depois recebemos Juscelino, com a substituição
de importações. E tivemos sorte na sequência. Assim como os argentinos, fomos
vítimas de uma era ditatorial, mas nossos generais eram industrialistas, ao
contrário dos generais deles, que destruíram a base manufatureira.
Claro
que isso é uma redução, as coisas não se definem apenas pela personalidade ou
por convicções dos líderes. As circunstâncias históricas moldam as ações de
quem comanda. Mas que o indivíduo tem um papel na História, isso tem.
Industrialização
não é processo indolor, especialmente para quem chega tarde ao baile, e não
pode portanto se movimentar livremente na busca de mercados consumidores e
fontes de matéria-prima.
Essa
tensão entre velhas e novas potências industriais ofereceu o substrato para as
duas grandes guerras mundiais do século passado. Muitas dezenas de milhões de
mortes ficaram no registro histórico para comprovar.
Industrializar
exige sacrifícios. Exige poupança e também competitividade da força de
trabalho. Mas não é, como se poderia supor, uma questão de destino. É sempre
decisão política, e que, aí sim, depende em bom grau do que deseja a liderança
política.
O
viés anti-industrialista no Brasil não é danação de origem divina. É produto de
escolhas. De uma sociedade que se acostumou a combinar 1) a aversão ao trabalho
braçal, traço herdado de quatro séculos de escravidão, 2) o hábito de contar
com poupança alheia para sustentar o próprio consumo, 3) o recurso a uma
agricultura de potencial supostamente infinito e 4) a ilusão de que o estado
sempre virá em socorro quando as coisas derem errado.
Da
colônia ao Império e deste à República o Brasil urbanizou-se, democratizou-se,
deixou de ser uma sociedade de camadas congeladas. Mas aqueles traços não foram
superados.
Até
temos indústria, mas nem de longe ela é o setor dinâmico da economia. Por estes
dias assistimos a uma guerra que a Apple, paradigma planetário de inovação
industrial, trava com a coreana Samsung. O Brasil, infelizmente, vai a anos-luz
de ter uma empresa que possa competir com a Apple.
Nas
ruas brasileiras trafegam cada vez mais marcas de automóveis. As montadoras
instalam-se aqui para ocupar mercado. Só não há marcas brasileiras de carros.
Nossa
indústria aeroespacial come poeira. Verdade que temos uma importante montadora
de aviões, a Embraer, mas é só. Outro ramo estratégico, a nossa indústria
bélica, deixou na prática de ter relevância, nacional e globalmente.
O
leitor e a leitora poderão objetar com estatísticas sobre a participação da
indústria no produto etc. Aqui os números mascaram o fato já dito, da ausência
de dinamicidade industrial no país. Há quanto tempo você não ouve falar que o
PIB industrial está puxando o crescimento econômico?
Para
a acomodação à sina vale de tudo. Até a constatação de que o baixo crescimento
ajuda a preservar o meio ambiente. Uma pedra verde juntada ao edifício
ideológico de séculos.
Eis
por que merece atenção o gesto do governo Dilma Rousseff, de, por meio do
Comitê de Política Monetária, cortar os juros em cenário inflacionário
desafiador. A resposta veio. O dólar pouco a pouco vai recuperando valor diante
do real.
Para
decepção dos que diziam que a hipervalorização da moeda pouco ou nada tinha a
ver com o diferencial dos juros internos e externos. Para esperança dos que sonham
com um Brasil independente, finalmente liberto das suas amarras
anti-industrialistas.
Coluna
(Nas entrelinhas) publicada nesta quarta (07) no Correio Braziliense.
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