Economista
e professor universitário avalia que, na melhor hipótese, EUA voltarão a
crescer normalmente só em 2013
Fonte:
Estadão.com
Professor
da Universidade George Washington, o economista americano William Handorf foi
testemunha privilegiada do processo que, em 2008, culminou no estouro da bolha
imobiliária americana. Era diretor do Federal Reserve (FED, o banco central dos
Estados Unidos) entre 2001 e 2006. Na função que exercia, não votava nas decisões
de política monetária (taxa de juros). Mas participava do dia a dia da
instituição.
Especialista
justamente em finanças do setor imobiliário, Handorf conta que, pouco antes de
deixar o FED, provocou os colegas. Para ele, estava claro que a instituição
falhava na supervisão do sistema financeiro. Durante uma exposição, afirmou:
"Acredito que estamos entrando em uma nova fase que mostrará falhas na
supervisão. Digam-me se - e por que - estou errado." Segundo ele, a reação
foi de incredulidade.
Handorf
avalia que a economia americana só vai recuperar a vitalidade, na melhor das
hipóteses, em 2013. Até lá, afirmou, a taxa de desemprego continuará elevada
(hoje está na casa dos 10%). "É uma recessão longa e severa." Ele
concedeu entrevista ao jornal O Estado de São Paulo após dar palestra num
evento da Fecomércio em São Paulo. Leia os principais trechos da entrevista.
Estadão:
O sr. acredita que o Federal Reserve adotará mais uma rodada do chamado
afrouxamento quantitativo (QE3)? Se adotar, terá efeito positivo na economia?
William
Handorf: Se vão adotar ou não, é uma questão que cabe ao Comitê de Mercado
Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do FED. Se eles deveriam fazer ou não, minha
resposta é a seguinte: a probabilidade de que funcione é muito pequena. As
taxas de juros nos EUA já estão muito baixas.
Estadão:
O FED acertou ao informar publicamente, em sua última reunião de política
monetária, que a taxa de juros vai ficar baixa ao menos até 2013?
WH:
Se eu fosse um integrante do FED com direito a voto, teria sido mais um a
discordar (dos dez diretores do FED que votaram, três foram contrários). Não há
dúvida de que o FED tem de manter os juros baixos, pois o mandato do BC
americano não é apenas para manter a inflação baixa. Deve também dar atenção ao
crescimento. É algo que faz o FED ser diferente de muitos bancos centrais. Mas,
apesar disso, não se pode brincar com a inflação. É uma experiência, aliás, que
vocês brasileiros conhecem bem. Leva um tempo muito longo para a inflação e as
expectativas baixarem.
Estadão:
Cresceu a probabilidade de uma nova recessão nos EUA?
WH:
Sim. No ano passado, a probabilidade de uma recessão era de 5%. Diria que, nos
últimos seis meses, essa chance cresceu para 20%. O cenário eleitoral
contribuiu para essa elevação.
Estadão:
Como assim?
WH:
Já de olho na eleição, o Congresso e o Executivo demoraram para encontrar um
acordo sobre o aumento do teto da dívida. O gatilho para esse assunto - o
rebaixamento da nota de classificação de risco pela agência Standard &
Poor’s - foi apenas simbólico. Mas indica, de qualquer maneira, que temos
problemas no país. Goste-se ou não dessas agências, é uma opinião respeitada no
mercado.
Estadão:
O sr. disse, em sua apresentação, que a questão do emprego é a chave para a
economia americana hoje. Por quê?
WH:
Cerca de 8 milhões de americanos perderam seus empregos durante a recessão.
Alguns empregos têm sido criados tanto no setor público quanto no privado, mas
em quantidade insuficiente. O problema é que os EUA precisam criar entre 1
milhão e 2 milhões de empregos por ano apenas para dar conta da imigração e dos
jovens que entram no mercado. Ou seja, enquanto todos esses empregos não forem
criados, com salários minimamente razoáveis, será difícil imaginar uma
recuperação.
Estadão:
Quando o sr. imagina que o cenário para o emprego nos EUA apresentará melhora?
WH:
Provavelmente não antes de 2013, talvez só em 2014. É uma recessão longa e
muito severa. Não é uma recessão que se resolverá facilmente, pois há algo que
continua machucando a economia: o setor imobiliário, que demanda enorme
contingente de mão de obra.
Estadão:
O sr. foi diretor do Fed.
WH:
Fui diretor. Não votava nas decisões do Fomc.
Estadão:
Trabalhou na época em que Alan Greenspan era o presidente.
WH:
Sim, em parte. Fui diretor entre 2001 e 2006 (Greenspan deixou o cargo
justamente em fevereiro daquele ano).
Estadão:
Como avalia o trabalho dele? Naquela época, ele era uma espécie de deus do
mercado.
WH:
Concordo com a maneira como Greenspan comandou a política monetária, mas ele
falhou na supervisão do sistema. Ele não reconheceu o alto risco dos
empréstimos hipotecários. Se fosse eleger as cinco causas principais da crise,
colocaria em primeiro lugar o papel do FED. Certa vez, minha mulher me viu
chegar em casa chateado após uma reunião em que havia falado sobre o alto risco
daqueles empréstimos e as consequências para o mercado. A percepção era de que
tudo estava bem. No fim de meu período no FED, fiz uma colocação, não era um
discurso formal, em que disse: "O FED tem uma longa história de falhas em
política monetária e na política de supervisão. Acredito que estamos entrando
em uma nova fase que mostrará falhas na supervisão. Digam-me se - e por que -
estou errado."
Estadão:
E qual foi a reação?
WH:
Foi de incredulidade. Como um diretor do FED poderia dizer aquilo? O homem a
quem fiz a pergunta ficou indignado.
Estadão:
Quando os EUA voltarão a crescer de acordo com o potencial?
WH:
Os EUA precisam crescer de 3% a 4% ao ano para criar os empregos necessários.
Ficaria surpreso se isso acontecesse antes de um ano e meio ou dois.
Estadão:
E o Brasil nesse cenário?
WH:
Não gostaria de falar sobre o Brasil. Meu foco de análise são os Estados
Unidos. O que se pode dizer, genericamente, é que o Brasil tem uma classe média
emergente muito grande, que vai gerar demanda doméstica.
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