O
juiz Roberto Scarpinato foi um dos principais magistrados da Itália no combate
às organizações mafiosas. Atuou nos anos 1980 e 1990 ao lado do magistrado
Giovanni Falcone, morto no ano de 1992, em atentado da máfia siciliana. Ele
participou da Operação Mãos Limpas, que debilitou a máfia italiana e fez entrar
em colapso um esquema de fraudes no sistema partidário do país. Também foi o
responsável pela sentença dada a Giulio Andreotti, sete vezes primeiro ministro
da Itália, condenado a 24 anos de prisão por cumplicidade com a máfia.
Agência Brasil
Protegido
por seguranças, Roberto Scarpinato esteve em São Paulo na última semana. Em
entrevista à Agência Brasil, falou sobre seu trabalho no combate ao crime
organizado e sobre a “vitória” da Itália contra a máfia. Ele destacou como
principal fator de sucesso contra os mafiosos, diferentemente do que ocorre no
Brasil, a atuação de uma Polícia Judiciária independente, controlada pelo
Judiciário, e não pelo Executivo.
“O
grande sucesso da Itália é que a magistratura do Ministério Público, além da
independência, tem todo o controle da atividade policial. E tem a possibilidade
de investigar e de buscar as autorias e a materialidade dos crimes
independentemente”, disse.
No
Brasil, as atribuições de Polícia Judiciária são da competência das polícias
Civil, subordinadas ao Poder Executivo dos estados, e da Federal, comandada
pelo Executivo Federal.
Fatores
importantes no combate ao crime organizado, de acordo com Scarpinato, foram
também a criação de um corpo de magistrados e de uma polícia altamente
especializados em organizações criminosas do tipo máfia, assim como a
elaboração de uma legislação apropriada para enfrentar o fenômeno mafioso.
“Não
se pode combater o crime organizado com as mesmas leis e as mesmas regras que
valem para uma associação deliquencial simples, como quadrilhas e bandos, por
exemplo. Para se combater um cancro, não se pode usar o mesmo remédio para se
combater um problema estomacal comum”, comparou.
Há
um artigo específico na legislação italiana para associações criminosas, de
matriz mafiosa. A pena mínima é 20 anos de prisão. O regime de detenção de
membros do crime organizado na Itália também é diferenciado. Segundo o
magistrado, não há visitas íntimas e o contato com o mundo exterior ao presídio
é reduzido. Todas as conversas entre presos e visitas, com exceção dos diálogos
com os advogados, são gravadas. “Não bastava só condenar um mafioso à privação
de liberdade. Um membro de uma organização mafiosa potente continuaria a enviar
mensagens à sua organização de modo a continuar a comandar o crime”.
Scarpinato
destacou ainda a atuação da sociedade civil no combate ao crime organizado na
Itália. O magistrado exemplifica que a Associação Comercial italiana passou a
excluir dos seus quadros os empresários que não denunciam a máfia, e pagam as
taxas exigidas para a proteção mafiosa.
Também
a opinião pública, de acordo com o juiz, teve papel fundamental para pressionar
o governo italiano a não deixar sem proteção os magistrados que combatem o
crime organizado. “O ministro do Interior do governo anterior, que é o ministro
da Segurança Pública, preparou um ato para tirar a escolta de alguns juizes.
Houve grande pressão em contrário da opinião da pública, e ele teve que mudar
de posição. O povo se revoltaria e não aceitaria nunca, e faria pressões ao
saber que um magistrado ficou sem escolta. Um crime como o da juíza Patrícia
Acioli seria inaceitável hoje na Itália”, disse. O assassinato de autoria do
crime organizado ocorreu na noite do dia 11 de agosto. A juíza foi executada a
tiros em frente ao condomínio onde morava, em Niterói, Rio de Janeiro.
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