Estudo
da Comissão Mundial para Políticas Antidrogas mostra que a "guerra
às drogas" iniciada há quatro décadas pelo então presidente dos EUA,
Richard Nixon, é um fracasso rotundo, contundente e irremediável. Bilhões de
dólares e milhares de vidas mais tarde, a produção, o comércio e o uso das
drogas ilegais continua crescendo a todo vapor.
O
maior mercado consumidor é os Estados Unidos, que consome anualmente cerca de
165 toneladas de cocaína. A América Latina entra com a produção e os mortos. O
artigo a seguir é de Eric Nepomuceno:
Fonte: Carta Capital
Um
estudo recente realizado pela Comissão Mundial para Políticas Antidrogas, que
conta com o aval da ONU, chegou a uma conclusão óbvia, mas nem por isso menos
eloqüente: o que o mundo anda fazendo para combater o uso de drogas ilegais, a
tal "guerra às drogas" iniciada há quatro décadas pelo presidente
norte-americano Richard Nixon, é um fracasso rotundo, contundente e
irremediável. E a razão de terem chegado a essa conclusão é simples: bilhões de
dólares e milhares de vidas mais tarde, a produção, o comércio e o uso das
drogas ilegais continua crescendo a todo vapor. Aliás, cresce tanto que hoje em
dia cocaína e heroína custam muito menos do que custavam há vinte anos.
Calcula-se
que existam no mundo 270 milhões de usuários de drogas. Um Brasil e meio. Uma
população 27 vezes maior que a de Portugal, quatro vezes e meia maior que a da
França, seis vezes maior que a colombiana. Enfim, um número de pessoas que,
reunidas, formaria o quarto país mais populoso do mundo.
O
maior mercado consumidor é os Estados Unidos, que consome anualmente, segundo
os cálculos mais fiáveis, cerca de 165 toneladas de cocaína. Em segundo lugar,
mas avançando rapidamente, vem a Europa, que consome cerca de 124 toneladas
anuais. Esses dois mercados são abastecidos basicamente pela produção
latino-americana de cocaína, mais especificamente da região andina, ou seja,
Bolívia, Peru, Colômbia e, em medida quase insignificante, Equador. A maior parte
do que chega aos Estados Unidos passa pelo México, onde, aliás, se consome 17
toneladas anuais, deixando o Canadá, com suas 14 toneladas, para trás.
Para
a Europa, outras rotas são mais utilizadas, levando a cocaína latino-americana
via África do Sul e, em muito menor medida, através do Brasil.
Para
a América Latina, esse mundo de droga produzida e negociada tornou-se um
problema que em alguns países ameaça escapar de controle. Sabe-se bem da
convulsão enfrentada pelo México, fala-se de como a Colômbia pouco a pouco
procura voltar aos eixos, mas pouco ou nada se fala do que acontece nos países
da América Central. Lá, pelo menos três países – El Salvador, Honduras e
Guatemala – que mal se recompõem do flagelo de prolongadas guerras civis correm
o gravíssimo risco de se tornarem vítimas terminais do crime organizado pelo
narcotráfico.
Se
economias aparentemente prósperas, se países que vivem tempos de bonança,
enfrentam a ameaça de poderes paralelos formados pelos grandes cartéis de
drogas, o que dizer de países pequenos, que mal cicatrizam as chagas de um
passado recente? Vale recordar um estudo do Banco Mundial, indicando que, na
América Central, o custo do crime e da violência corresponde a 8% do PIB da
região.
Muito
se menciona a Colômbia como exemplo bem sucedido da luta contra o tráfico de
drogas. Um exame mais sereno e meticuloso mostra que a realidade não é bem
essa. Diminuiu, e muito, a violência, é verdade. Mata-se e morre-se hoje menos
do que há dez ou quinze anos. O volume de drogas exportadas, porém, permaneceu
praticamente inalterado. Uma série de fatores que são impossíveis de se
reproduzir em outros países funcionou na Colômbia, que, além de drogas,
exportou o caos – basta ver o que acontecia há dez ou quinze anos no México e
na América Central, e o que acontece agora. Ou seja, cura-se aqui enquanto
feridas são abertas ali e acolá.
Resta
ver, além do mais, que medidas os Estados Unidos pretendem tomar para impedir o
fluxo de armas para os países exportadores de drogas. De cada dez armas aprendidas
no México, sete saíram dos Estados Unidos. O governo colombiano detectou e
apreendeu vários carregamentos de armas de pequeno calibre – revólveres,
pistolas – despachados dos Estados Unidos pelo correio.
A
questão é vasta e profunda, mas até agora não conseguiu levar a trilha alguma
que seja capaz de encaminhar, se não para uma solução, ao menos para um
paliativo eficaz. E nesse mercado em franca expansão, nessa festança macabra,
enquanto norte-americanos e europeus continuam pondo os usuários, os latino-americanos
continuam pondo as drogas e os mortos. Na Colômbia, perdeu-se a conta. No
México, pelo menos 42 mil nos últimos cinco anos, e caminha-se rápido para a
marca dos 50 mil.
Na
América Latina, os produtores e exportadores de drogas são empresários bem
sucedidos, sem dúvida. Lucram cada vez mais, e mostram que sabem defender seus
interesses, não importa ao custo de quantas vidas.
Pena
que esses latino-americanos, empreendedores bem sucedidos, tenham preferido
manter seus negócios em nossas comarcas. Bem que poderiam seguir o exemplo dos
plantadores de maconha na Califórnia. Lá, os empreendedores locais conseguiram
um feito notável: hoje em dia, a maconha é o mais bem sucedido cultivo em todo
o estado. Rende cerca de 14 bilhões de dólares por ano. Plantam, processam,
comercializam – e nenhum latino-americano morre por causa deles.
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