A
ONU aprovou Resolução, na quinta-feira, 22 de dezembro, em Nova York,
declarando 2014 como Ano Internacional da Agricultura Familiar. Agora, é
oficial e definitivo. O Ano Internacional da Agricultura Familiar da ONU é o
primeiro caso precedido por uma campanha mundial em favor de sua declaração.
A
campanha elaborada em julho de 2010 teve como objetivos: promover, em todo o
mundo, a elaboração e efetivação de políticas públicas que garantam a
viabilidade e o fortalecimento da agricultura familiar, com sustentabilidade,
no campo; de potencializar o papel das organizações e movimentos sociais
dependentes e defensores do meio ambiente, além de sensibilizar a sociedade civil
sobre a importância de agricultura familiar.
De
acordo com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura (FAO) e o
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agraria (INCRA), a agricultura
familiar se define com base em três características: a gerência da propriedade
rural é feita pela família; os fatores de produção pertencem à família (exceção,
às vezes, a terra), e são passíveis de sucessão, em caso de falecimento ou
aposentadoria dos gerentes.
Conforme
o IBGE, o segmento foi definido pela Lei n° 11.326, de 2006, a qual considera
familiar o estabelecimento ou empreendimento rural que não exceda quatro módulos
fiscais; a mão-de-obra e a gerência utilizada na atividade sejam predominantemente
da própria família, e a maior parte da renda seja originada dessas atividades.
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Para
o IBGE, a agricultura familiar tem um grande peso na produção de alimentos no País.
Segundo o Censo Agropecuário de 2006, são mais de quatro milhões em todo o País,
o que significa quase 40% da riqueza agropecuária brasileira, exatos 38% -
envolvendo 4,3 milhões de estabelecimentos agrícolas, 84% do total, trabalhando
em apenas 24,3% da área agrícola, e contando com 12,3 milhões de pessoas
trabalhando.
Os
dados do Instituto impressionam. Entretanto, são questionados pela Confederação
Nacional da Agricultura – CNA, que, em suas falácias, continuarão a levantar as
bravatas que fortalecem o grande latifúndio e o uso intensivo da terra,
promovendo a exaustão da capacidade de suporte do solo, assim como a ampliação
de áreas, via desmatamento, de Áreas Preservação Permanente em nome de um ganho
capitalista excludente.
Assim,
enquanto a Resolução se torna o marco de uma Campanha Mundial, espera-se que o
conceito de rurbano seja fortalecido, para que as comunidades possam solicitar
políticas públicas que promovam a permanência do homem em seu espaço, com
dignidade; a discussão a cerca da agriculta familiar se arrasta desde os anos
90, e é questionada por uma série de senões que devem ser desmistificados e que
se destacam: os problemas relacionados à grande concentração fundiária; as
desigualdades regionais; ao modelo de organização sociopolítico e econômico;
aos segmentos governamentais comprometidos com os interesses dos grandes
proprietários, com os interesses Internacionais, além do fortalecimento do
movimento dos trabalhadores que lutam pelo direito de reconquistar a terra.
É
verdade que a agricultura familiar, no Brasil, não tem o destaque merecido,
diferente do que acontece em nível internacional, que é tida como produtora de
alimentos e como um dos principais atores na luta pela segurança e soberania
alimentar. Essa realidade deve ser modificada, uma vez que é sabido que a
superação da linha da pobreza por contingente expressivo da população periférica
tem ampliado o consumo, dinamizando a economia. Entretanto, como afirma
Boaventura Santos, é evidente [...] “a polarização social que está a emergir
das enormes desigualdades sociais. Por enquanto, a mobilização contra a
escandalosa desigualdade social (semelhante à de 1848) é pacífica e tem um
forte pendor moralista denunciador”. Isso faz com que interesses se sobreponham
e gerem discursos falaciosos.
Acredito
que, alcançados os objetivos de diminuir o êxodo rural e proporcionar o acesso
a terra, através de reforma agrária consistente, possam ser alguns dos benefícios
da ampliação da Agricultura familiar, para prover a identidade que se faz
necessária, uma vez que a resolução amplia o espaço para a abertura do comércio
internacional de produtos, favorecendo a relação entre os mercados locais e
regionais; amplia o acesso às novas tecnologias e pesquisas, em produção mais
limpa e sustentável, além de promover a inserção dos agricultores familiares no
comércio global.
A
partir do exposto, concordo com Manuel Castells, quando entende identidade como
[...] “a fonte de significados e experiência de um povo”. Entendo que o
fortalecimento da Agricultura Familiar passa pela construção de sua identidade
como caminho a retirar o homem do campo da miséria em que foi posto por longos
anos. Sei que o debate é complexo. Entretanto, merece uma reflexão por parte da
sociedade e daqueles que a representa. Acredito que a Agricultura Familiar pode
reduzir esse foço entre o rural e o urbano, e a questão rurbana pode ser mais
fortalecida. O agricultor familiar deve entender sua propriedade como o caminho
que lhe proporcionará liberdade de habitar o rural com a dignidade que dizem
que há no urbano.
O
que acham? Chegaram a hora e a vez?
*Marígia
Tertuliano é economista e professora universitária
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