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Sávio Ximenes Hackradt

7.7.11


Portal Vermelho – BBC/Brasil
O bom momento da economia brasileira vem há tempos sendo propagandeado ao redor do mundo como exemplo para a recuperação após a crise global de 2008. No entanto, já começam a crescer as vozes divergentes que alertam sobre possíveis estouros de bolhas que levem a uma desaceleração no país.
“As pessoas estão subestimando os problemas na economia brasileira”, adverte o analista Neil Shearing, economista sênior para mercados emergentes da conceituada consultoria britânica Capital Economics.
“Fundamentalmente, o ritmo e a natureza do crescimento brasileiro não são sustentáveis”, afirma Shearing à BBC Brasil.
Entre os pontos de vulnerabilidade da economia brasileira apontados por analistas em relatórios e artigos recentes estão questões como a expansão do crédito com juros altos, a sobrevalorização do real, os riscos de inflação, o alto preço das commodities e a valorização excessiva no mercado imobiliário nas grandes cidades brasileiras.
“O estouro da bolha de crédito deve ser bastante grave e levar a economia a uma desaceleração”, disse à BBC Brasil por e-mail, de Hong Kong, Amit Rajpal, gerente de portfólio do fundo de investimentos Marshall Wace.
Em um artigo publicado nesta semana pelo diário econômico Financial Times, Rajpal e Paul Marhsall, diretor de investimentos do Marshall Wace, alertam para o risco de uma crise no setor de crédito no Brasil, citando um aumento dos gastos proporcionais das famílias brasileiras com o pagamento de suas dívidas e a perspectiva de aumento dessa proporção por conta dos juros em alta.
"O peso no fluxo de caixa (das famílias) é astronômico e está crescendo", escreveram.
O artigo de Rajpal e Marshall é o último de uma série que vem aparecendo nas últimas semanas em diferentes veículos especializados para alertar sobre riscos enfrentados no Brasil.

Em um relatório publicado na semana passada, a Capital Economics faz um alerta sobre as perspectivas negativas da indústria no Brasil, apesar do crescimento na produção registrado em maio, e sobre a contínua valorização do real, que “está distorcendo a economia brasileira”.
A consultoria britânica mantém suas previsões positivas sobre a economia do país no curto prazo, mas advertiu em um relatório anterior sobre “um crescente risco de que a economia superaqueça ou que bolhas comecem a inflar”.
Para a Capital Economics, a vulnerabilidade da economia brasileira advém de dois fatores: a força do fluxo de capitais para o país e o aumento rápido do crédito para o consumo interno.
A consultoria avalia que o excesso de divisas nos países com grandes superávits em conta corrente, como a China ou a Alemanha, vai se manter, o que significa que os fluxos de capital para as economias emergentes, como o Brasil, também se manterão altos, já que o capital excedente nesses países buscará investimentos com taxas de retorno maior, por conta das altas taxas de juros.
O relatório adverte que isso é um problema, porque essa entrada de divisas está sendo usada para estimular o consumo interno, com o aumento do crédito, em vez de gerar investimentos em capacidade produtiva, aumentando as pressões inflacionárias.
A consultoria avalia que, apesar das ações pontuais do governo para tentar controlar os problemas apontados, “os desafios podem finalmente se provar grandes demais”.
Para o analista Neil Shearing, essas eventuais bolhas devem estourar até 2013, mas não a ponto de levar a uma recessão.
“Nossa previsão para 2013 é de um crescimento de 2% a 3%, que poderia ser considerado fantástico para as economias desenvolvidas, mas não para o Brasil, que precisa de um crescimento de pelo menos 3% a 4% para poder compensar o aumento populacional e gerar empregos”, observa.
Amit Rajpal vê a possibilidade de uma desaceleração mais acentuada na economia. “Se vai haver ou não uma recessão vai depender da gravidade do estouro da bolha de crédito”, afirma.
Para ele, o governo brasileiro falhou em não adotar medidas mais rápidas para conter o fluxo de capitais, para estimular as taxas de poupança interna e para conter os gastos públicos.
Rajpal considera que as medidas já adotadas pelo governo para conter o crédito ao consumo “são muito limitadas em escopo”. “O crédito ainda está crescendo muito rápido e precisa ser contido”, afirma.
No artigo publicado nesta terça-feira, Rajpal e Marshall observam que algumas medidas adotadas pelo governo, como a elevação das taxas básicas de juros, têm o efeito de aumentar o peso do serviço das dívidas sobre os devedores.
Segundo eles, a taxa média de juros nos empréstimos para consumo já subiram de 41%, no ano passado, para 47% em maio deste ano, elevando com isso de 24% para 28% a proporção da renda disponível das famílias brasileiras usada para o serviço de suas dívidas (na classe média, essa proporção já teria passado dos 50%).
Em comparação, a proporção da renda disponível para o pagamento de dívidas é de 16% nos Estados Unidos e ainda mais baixa em outras grandes economias emergentes como a Índia (4,8%) ou a China (6,5%).
Eles advertem ainda sobre o aumento do índice de atrasos de mais de 15 dias nos pagamentos das dívidas, de 7,8% do total de empréstimos para 9,1% entre dezembro do ano passado e maio deste ano.
Para Rajpal e Marshall, a queda de mais de 10% no índice Bovespa, da Bolsa de Valores de São Paulo, desde o início do ano pode ser uma indicação de que os investidores já começam a se preocupar com a saúde futura da economia brasileira.
Os dois observam que muitos analistas e investidores ainda mantêm suas previsões positivas sobre a economia brasileira, mas avaliam que as dúvidas sobre as análises conflitantes devem ser respondidas antes do final deste ano.
Em maio, o FMI (Fundo Monetário Internacional) também alertou para o risco de um superaquecimento da economia brasileira, mas elogiou as medidas tomadas pelo governo do país para cortar os gastos públicos e para reduzir os empréstimos concedidos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Apesar dos crescentes sinais de alerta sobre a economia brasileira, alguns analistas mantém uma visão positiva e descartam estouros de bolhas.
O economista americano John Williamson, do Institute for International Economics, de Washington, afirma que não existem sinais de bolhas e diz que o maior problema para a economia brasileira hoje é a questão da sobrevalorização do real.
Ainda assim, Williamson, que ficou famoso por cunhar o termo Consenso de Washington, conceito que agrega políticas liberais aplicadas na América Latina nos anos 90, afirmou que não acredita que essa questão tenha o potencial de prejudicar seriamente o crescimento brasileiro ou de que tenha saído do controle.
Para ele, a solução para o fortalecimento do real é “continuar aplicando as medidas que o governo já vem adotando”.
Simon Knapp, economista sênior da consultoria Oxford Economics, afirma que o aumento do crédito no Brasil não preocupa e não vê sinais de bolhas no setor.
“Apesar do crescimento, o nível de endividamento no Brasil ainda é modesto, de cerca de 50% do PIB, enquanto nos Estados Unidos e nos principais países europeus esse nível é três vezes maior”, observa.
Enquanto Rajpal e Marshall vêem no aumento dos juros um fator para o possível estouro de uma bolha de crédito, Knapp afirma que o alto custo do crédito tem o efeito de manter os empréstimos a um nível aceitável.
“Não creio que haja uma sensação geral de que o aumento do crédito seja um problema no Brasil”, diz.
Ainda assim, ele prevê uma desaceleração considerável nos próximos anos, com um crescimento estabilizado em um “ritmo sustentável de 4% ao ano”.
Para Knapp, o grande problema da economia brasileira hoje é a ameaça da inflação e a necessidade de balancear o controle dos preços não somente com o aumento das taxas de juros, mas também com o controle de gastos do governo.
Ele observa que o aumento excessivo dos juros acaba gerando o efeito colateral de atrair mais capitais ao país e reforçar a valorização do real. Para evitar isso, observa, é necessária também uma política fiscal mais austera.
“O Banco Central brasileiro se mostrou nos últimos anos bastante competente em conter os riscos de inflação”, comenta. “A política monetária brasileira certamente não é frouxa, mas o desafio é balancear isso com uma política fiscal mais dura também”, diz.

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