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Sávio Ximenes Hackradt

9.10.11


Márcia De Chiara, de O Estado de S. Paulo
A nova classe média já gasta mais com serviços do que com bens de consumo, revela estudo do instituto Data Popular. De cada R$ 100 desembolsados hoje, R$ 65,20 são com serviços e R$ 34,80 com produtos. Há 9 anos, as proporções entre gastos com serviços e bens de consumo estavam equilibradas. Eram de 49,5% e 50,5%, respectivamente.
O aumento do gasto com serviços da classe C, que é mais da metade (54%) da população do País, dificulta a tarefa do Banco Central de trazer a inflação para o centro da meta, de 4,5%. É que os serviços não podem ser importados para conter a alta de preços. Além disso, seus preços são influenciados pelo salário mínimo, que tem reajuste programado de 14% para o ano que vem.
"É a primeira vez que o gasto com serviços da classe C supera o desembolso com a compra de produtos", afirma Renato Meirelles, sócio diretor do instituto e responsável pelo estudo. Nos extremos da pirâmide social, no entanto, o estudo mostra que o perfil de consumo se manteve. Isto é, a alta renda continua gastando mais com serviços como proporção das despesas totais e a baixa renda, com produtos.
O trabalho considera como classe C as famílias com renda média familiar de R$ 2.295. As projeções do perfil de gastos da classe C para este ano foram feitas com base no cruzamento de dados da Pesquisa de Orçamento Familiar e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE. O estudo separa as despesas das famílias em bens e serviços num horizonte mais amplo, que inclui não só serviços livres, mas administrados, como energia elétrica, por exemplo.
Comida. Um recorte revelado pelo estudo é que a classe C desembolsa hoje mais com serviços considerados opcionais segundo os critérios do trabalho, como despesas com cabeleireiro, manicure, sapateiro, lavanderia, entre outros, do que com alimentos, que é um gasto obrigatório. Nesse caso, a proporção de gastos com esses serviços opcionais (22,6%) chega a ser quase o dobro do desembolso com a comida na casa da classe C (11,8%).
Entre os serviços com maior crescimento nos últimos cinco anos nos gastos da classe C estão manutenção do lar (211,23%), mensalidade escolar (181,23%) e viagens (158,25%). Meirelles diz que, ao equipar a casa com mais eletrônicos, a classe C gasta mais com serviços de energia.
Marcelo Neri, coordenador do Centro de Políticas Sociais da FGV, pondera que a valorização do real ajudou a mudar o perfil de consumo da classe C ao reduzir o preço dos bens transacionáveis. Mas ele ressalta que a classe C gasta mais com serviços porque também se beneficia do processo. É que o setor de serviços é o grande empregador da classe C. "A cabeleireira consegue hoje fazer turismo no Nordeste porque o penteado ficou mais caro. É um processo autofágico."

Preço dos serviços. Nos últimos cinco anos, a inflação dos serviços tem ficado acima da inflação total, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em 12 meses até setembro, a inflação dos serviços subiu 9,84% e o IPCA acumula alta de 7,31%.
"Neste ano e no próximo não deverá ser diferente", diz o economista da consultoria Tendências Thiago Curado, lembrando o elevado nível de indexação, na casa de 40%, que persiste na economia, sustentado especialmente pelo salário mínimo. Para um IPCA projetado pela consultoria de 6,6% em 2011 e de 6% em 2012, ele estima que os preços dos serviços devem subir 8,5% a cada ano.
A dificuldade de reduzir a inflação de serviços se deve ao aumento da própria procura por serviços, mantida em boa parte pela nova classe média, que mudou a estrutura social do País. "Entre 2003 e 2011, cerca de 40 milhões de pessoas terão ingressado na classe média", calcula o coordenador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcelo Neri.
Com mais emprego e renda no bolso, proporcionada pelo próprio setor de serviços, essa população emergente ampliou sua lista de despesas, que anteriormente estava concentrada em produtos. Com isso, ajuda a manter a demanda aquecida por serviços. "O carrinho do supermercado tem limite. Os serviços, não", observa o sócio diretor do Data Popular, Renato Meirelles, que tirou uma fotografia do perfil de consumo da classe C.
A família do porteiro Francisco Lourenço Filho, de 44 anos, é o retrato fiel da nova classe média. Dez anos atrás, os gastos com alimentação dentro de casa representavam metade das despesas que ele e a mulher Anabel Sulpino de Andrade Lourenço, empregada doméstica, de 37 anos, tinham com os três filhos, Camila, Francisco Ramon e Gustavo. Atualmente, os desembolsos com alimentos respondem por 30% das despesas mensais. Nos últimos anos, a lista de gastos da família engordou junto com a renda. Serviços de internet, TV a cabo e celular e até gastos com almoço fora aos domingos não faziam parte da rotina da família.
"Hoje não fico sem internet", diz Lourenço, que usa o computador para falar com os parentes na Paraíba, ver notícias de Souza, sua cidade natal, e aprender violão em um curso gratuito disponível na rede mundial de computadores.
Já os filhos não abrem mão da TV a cabo e a mulher, do telefone celular. "Celular é um serviço obrigatório", diz Anabel. Ela considera esse um gasto que lhe proporciona conforto, assim como as duas viagens de avião, no lugar do ônibus, que fez nos últimos anos para visitar os pais no Nordeste. De vez em quando, ela conta que opta pelo táxi quando sai com toda a família.
A operadora de telemarketing, Elaine Cristina Alves da Silva, solteira, com 29 anos, também considera o telefone celular um serviço obrigatório. "Não dá para ficar sem, virou rotina", afirma.
Além do celular, os gastos com internet e as idas à lanchonete com a mãe e a irmã duas vezes por mês são serviços incorporados à lista de despesas. Dez anos atrás, metade da renda dela e da mãe, que era bem menor, era gasta com alimentos. Hoje essa fatia gira em torno de 30%.
Corte. Apesar de entusiasmada com o conforto que o consumo de serviço pode proporcionar, a nova classe média está atenta às altas de preços. A família Lourenço, por exemplo, reduziu de quatro para duas vezes por mês as idas ao restaurante. 
Em 12 meses, até setembro, comer fora de casa ficou 8,54% mais caro, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Mercado da FGV. No mesmo período, a inflação cheia, medida pelo mesmo indicador, foi de 7,11%.
ENTREVISTA - Silvia Matos, Economista do Ibre/FGV
‘Inflação de serviços é mais Resistente’
A economista Silvia Matos, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, diz que a alta dos serviços dificulta a queda da inflação. A seguir trechos da entrevista.
Qual é o dilema da inflação?
É que ela está alta e com forte contribuição de fatores permanentes. Fiz um estudo econométrico que compara a inflação do período de choque das commodities, entre junho e setembro de 2008, com o período mais recente, entre setembro de 2010 e setembro de 2011. No primeiro período, 80% da inflação foi explicada por fatores permanentes. Hoje essa fatia está em 95%. A contribuição de fatores transitórios para a alta da inflação tem sido menor no choque atual do que foi no passado. Naquele período o que pesou na inflação foram as commodities. Agora é mais complicado, pois a inflação tem mais rigidez.
O que explica essa rigidez?
Um dos fatores é a inflação de serviços. Todo mundo sabe que os serviços são mais persistentes. Além disso, boa parte dos serviços são indexados formal ou informalmente. O que está dificultando a nossa vida é que, depois da crise, a inflação de serviços só tem subido. Isso reflete uma mudança estrutural do padrão de consumo. É uma nova classe média que pode consumir serviços num setor em que há pouca competição e escassez de mão de obra, o que eleva custos. Há um aumento muito forte da demanda e a oferta não acompanha. Por isso, o preço sobe.

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