30.10.11
Postado por
Sávio Hackradt
O
economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, calcula que, em 2010,
através de programas sociais, o governo federal repassou a 31,8 milhões de
brasileiros - a maioria, pobres - R$ 114 bilhões. Ao incluir programas de
transferência de renda de menor escala, o montante chega a R$ 116 bilhões.
Por
Frei Betto*
Este
valor é mais que o dobro de todo o investimento feito pelo governo no mesmo ano
- R$ 44,6 bilhões, incluindo construção de estradas e obras de infraestrutura.
Os
R$ 116 bilhões foram destinados à rede de proteção social, que abarca
aposentadoria rural, seguro-desemprego, Bolsa Família, abono salarial, Renda
Mensal Vitalícia (RMV) e Benefício de Prestação Continuada (BPC). Esses
programas abocanharam 3,1% do PIB.
A
RMV, criada em 1974, era um benefício previdenciário destinado a maiores de 70
anos ou inválidos, definitivamente incapacitados para o trabalho, que não
exerciam atividades remuneradas, nem obtinham rendimento superior a 60% do
valor do salário mínimo. Também não poderiam ser mantidos por pessoas de quem
dependiam, nem dispunham de outro meio de prover o próprio sustento.
Em
janeiro de 1996, a RMV foi extinta ao entrar em vigor a concessão do BPC. Hoje,
a RMV é mantida apenas para quem já era beneficiário até 96. Já o BPC é pago a
idosos e portadores de deficiências comprovadamente desprovidos de recursos
mínimos.
Há
quem opine que o governo federal "gasta” demais com programas sociais,
prejudicando o investimento. Ora, como afirma Lula, quando o governo canaliza
recursos para empresas e bancos, isso é considerado "investimento”; quando
destina aos pobres, é "gasto”...
O
Brasil, por muitas décadas, foi considerado campeão mundial de desigualdade
social. Hoje, graças à rede de proteção social, o desenho da pirâmide (ricos na
ponta estreita e pobres na ampla base) deu lugar ao losango (cintura
proeminente graças à redução do número de ricos e miseráveis, e aumento da
classe média).
Segundo
o Ipea, entre 2003 e 2009, 28 milhões de brasileiros deixaram a miséria.
Resultado do aumento anual do salário mínimo e da redução do desemprego,
somados ao Bolsa Família, às aposentadorias e ao BPC.
A
lógica capitalista considera investimento o que multiplica o lucro da
iniciativa privada, e não o que qualifica o capital humano. Essa lógica gera,
em nosso mercado de trabalho, a disparidade entre oferta de empregos e mão de
obra qualificada. Devido à baixa qualidade de nossa educação, hoje o Brasil
importa profissionais para funções especializadas.
Se
o nosso país resiste à crise financeira que, desde 2008, penaliza o hemisfério
Norte, isso se deve ao fato de haver mais dinheiro em circulação. Aqueceu-se o
mercado interno.
Há
queixa de que os nossos aeroportos estão superlotados, com filas intermináveis.
É verdade. Se o queixoso mudasse o foco, reconheceria que nossa população
dispõe, hoje, de mais recursos para utilizar transporte aéreo, o que até pouco
tempo era privilégio da elite.
Há,
contudo, 16,2 milhões de brasileiros ainda na miséria. O que representa enorme
desafio para o governo Dilma. Minha esperança é que o programa "Brasil sem
miséria” venha resgatar propostas do Fome Zero abandonadas com o advento do
Bolsa Família, como a reforma agrária.
Não
basta promover distribuição de renda e facilitar o consumo dos mais pobres. É
preciso erradicar as causas da pobreza, e isso significa mexer nas estruturas
arcaicas que ainda perduram em nosso país, como a fundiária, a política, a
tributária, e o sistema de educação e saúde.
*
é escritor, autor de "Sinfonia Universal – a cosmovisão de Teilhard de
Chardin” (Vozes), entre outros livros.
Fonte:
Adital
Estação Música Total
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