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Sávio Ximenes Hackradt

8.1.11

ANDREA MURTA,
DE WASHINGTON – Folha de São Paulo

O jornalista americano Monte Reel encontrou no Brasil o homem mais sozinho do mundo: um índio sem tribo, que vive isolado de qualquer contato humano no coração da floresta Amazônica.

Pouco se sabe sobre ele: vive nu, tem cerca de 40 anos, usa arco e flecha e estranhamente cultiva um pequeno bigode. Sim, aparentemente há índios com pelo no rosto.

Mais de três anos de pesquisa sobre o caso sem precedentes resultaram no livro "The Last of the Tribe" (o último da tribo", Scribner, 2010, sem tradução no Brasil).

E estão a caminho de virar filme --com direitos comprados por estúdio, um diretor envolvido (Doug Liman, de "A Identidade Bourne" e "Fair Game") e agora em processo de roteirização.

O índio solitário foi visto pela primeira vez em Rondônia em 1996. Agentes da Funai fizeram várias incursões na mata para tentar se comunicar com ele, com a intenção de definir sua origem e facilitar o processo de demarcar a terra a que tem direito pela Constituição.

Não tiveram sucesso. Arredio, o índio chegou a dar uma flechada quase fatal em um membro da equipe que tentou aproximação.

Os brancos acabaram decidindo respeitar sua solidão --não sem antes lutar contra ameaças de todos os lados para garantir a ele um pedaço da floresta.

"Mas o que torna o homem no Brasil único não é meramente a extensão de sua solidão ou o fato de que o governo sabe que ele existe. É a forma como responderam a isso" afirma Reel, para quem a política de não fazer contato é uma aposta que merece ser feita.

O escritor, que vive em Buenos Aires, falou à Folha sobre os riscos reais e teóricos de um estrangeiro investigando segredos da floresta.

Folha - Há uma grande discussão no livro sobre o dilema entre a integração das tribos e a alternativa de deixar o índio isolado em paz. Com que visão o sr. saiu dessa experiência?
Monte Reel - Não há solução perfeita. A Funai acabou parando de tentar contatar o índio. A decisão de abandonar os esforços foi tomada por gente que trabalha com isso há muito tempo e viu o que as tentativas de forçar a aproximação podem causar.
Pessoalmente, acho que foi a coisa certa a fazer agora. Mas as coisas podem mudar a qualquer momento.

O sr. aborda a impunidade de madeireiros ilegais em relação a matanças de índios na Amazônia. Como avalia o desempenho de autoridades brasileiras na questão?
O livro não é inteiramente crítico ao governo. Eu defendo a posição das autoridades no caso específico desse índio. Realmente admiro as pessoas que trabalharam no caso.
Mas houve muitas decisões que considero erradas. E houve muitos erros no passado também.
O que eu queria era apresentar tanto quanto possível a história e o contexto e ser justo em abordar as razões por que esse assunto é tão controverso. Há muitos motivos pelos quais as pessoas querem e precisam desenvolver a terra [que foi reservada para o índio].
Essa tensão entre tentar estabelecer o que é uma quantidade aceitável de desenvolvimento de agricultura e corte de madeira e o que é demais é muito difícil. É por isso que o tema é tão complicado.

O sr. fala sobre como os funcionários da Funai são teimosos e pouco flexíveis, mas eles acabam aparecendo como heróis. Em uma obra quase jornalística, não incomodou adotar um lado tão abertamente?
Eu tentei ser justo e mostrar o lado dos que defendiam o desenvolvimento, mostrar o argumento deles em suas próprias palavras. Mas quanto mais me envolvi com a história, mais convencido fiquei de que os membros da Funai estavam certos. Eu admiro essas pessoas e não peço desculpas por isso. Esse livro é de certa forma uma tentativa de chamar atenção para o trabalho que fazem.
Reconheço que eles acabaram como os mocinhos, mas acho que pelo menos mostrei por que acredito que isso é correto.

Houve problemas com os fazendeiros?
Um pouco. Nem todos estavam abertos para falar. Há muita suspeita sobre alguém como eu, que chega fazendo perguntas sobre um tema difícil. Provavelmente, o maior desafio foi conseguir sentar e falar com as pessoas desse outro lado da questão.
Quando me apresento como jornalista americano, as pessoas são bem claras em demonstrar seu desagrado em ver um estrangeiro se metendo com a Amazônia.

Sendo de outro país, o sr. se preocupou em evitar romantizar demais a questão?
Sim, com certeza. Eu realmente tentei trabalhar com uma visão que fosse sensata e não lidasse com questões indígenas de forma apenas romântica. Na medida do possível, tentei me manter objetivo e não cair na ideia filosófica do "bom selvagem".
Estava bem consciente dos riscos de idealizar as culturas indígenas e sua forma de vida. Muita gente cai nessa armadilha.

Foi para evitar isso que o sr. retratou um assassinato violento entre tribos e os problemas que os índios da Amazônia tinham uns com outros?
Também. Quis contar essas histórias porque essa é a realidade da vida dessas pessoas. Não é uma vida perfeita, há muitos desafios.

O que o surpreendeu mais?
Eu não tinha nenhuma ideia sobre como as pessoas estão tentando viver [na floresta]. Não sabia nada sobre a rotina de uma tribo isolada. E achei esse tipo de coisa muito fascinante.
Passar tempo com essas pessoas que até relativamente pouco tempo atrás não tinham nenhum contato com o resto da sociedade brasileira --ir lá e ver como vivem-- foi o mais interessante.

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