CALANGOTANGO não é um blog do mundo virtual. Não é uma opinião, uma personalidade ou uma pessoa. É a diversidade de idéias e mãos que se juntam para fazer cidadania com seriedade e alegria.

Sávio Ximenes Hackradt

23.1.11

Fábio Farias - jornalista

Uma daquelas coisas que qualquer jornalista aprende logo no início da carreira é quanto ao seu papel na sociedade. O jornalismo, no sentido puro e até um tanto romântico da palavra, é o elemento que dá voz a população, que ajuda na fiscalização do poder, que defende o interesse da maioria. Peça fundamental de qualquer regime que se pretende democrático é ter uma imprensa livre e jornais atuantes, fortes.

Lembro de uma palestra que assisti no Congresso da Associação Brasileira de Jornalistas Investigativos (Abraji) em São Paulo, no ano passado. O palestrante era Rosental Calmon Alves, ex-editor do Jornal do Brasil e, atualmente, professor de jornalismo da Universidade de Austin, no Texas. O que ele disse foi marcante: o bom jornalista deve, não só ler, mas ter como princípio básico para sua profissão a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Pode parecer romântico ou utópico para os mais pessimistas os preceitos que citei acima, mas acredito que a utopia é que deve ser buscada. O ideal deve ser o nosso norte para tentarmos, sempre, realizar trabalhos melhores, que ajudem na construção de uma sociedade e de um mundo mais justo. Se não há utopia, se não há sonho, o princípio básico do jornalismo e, também, da política perde o seu sentido original.

Teóricos divergem sobre a melhor forma de estimular um jornalismo voltado para um mundo melhor. Se de um lado, na esquerda mais ortodoxa, há o risco do jornal ser peça do Estado e perder a liberdade crítica, de outro, em um sistema capitalista neoliberal, corre-se o risco da imprensa omitir fatos importantes, pelo interesse puramente comercial que a norteia.

Em Natal, alguns fatos tornam essa tensão ainda maior: a íntima relação entre políticos e os meios de comunicação e a dependência destes de verbas publicitárias dos governos estaduais e municipais. Como resultado desse contexto, a cidade atualmente vive uma situação peculiar.

As ações prefeita Micarla de Sousa (PV), que goza de extrema impopularidade, não são investigadas pela imprensa. As críticas da gestão dela são pequenas, pontuais e destoam do sentimento de revolta de grande parte da população que usa os blogs e as redes sociais para manifestá-las.

Enquanto tags como #foramicarla se multiplicam no meio online, o jornalismo, que deveria ter como papel investigar e cobrar ações da prefeita está silencioso, calado. Diferente do que aconteceu com Wilma de Faria (PSB), no final de sua gestão.

Não há nenhuma movimentação na imprensa para investigar e cobrar respostas de por que, por exemplo, a prefeitura fechou um contrato de 128 mil reais, junto a uma empresa de Brasília, para fazer o novo site. Um valor absurdo para quem conhece de informática e muito alto para uma gestão que declarou que iria cortar custos em 2011.

As conjecturas acima parecem ter respostas simples: os meios de comunicação colocam interesses políticos e comerciais acima do papel de servir ao bem público, à sociedade. A Secretaria de Comunicação do município é uma dos principais anunciantes dos jornais impressos da cidade, ela financia e paga, não a partir de critérios técnicos, mas a partir de um clientelismo político onde, a maior prejudicada é a população natalense. E grife-se: paga com nosso dinheiro.

Jornais, emissoras de TV e rádio, tornam-se mais permissivos quanto às ações desastrosas da prefeitura, na medida em que ela compra espaços publicitários deles. É uma espécie de pacto do silêncio, que só não é mais efetivo pela capilaridade da internet e por seu caráter puramente anárquico. As críticas têm como principal meio as redes sociais e os blogs.

Concentradas na internet, a insatisfação quanto à situação atual da prefeitura espalha-se em velocidade impressionante. No meio dessa revolta, há até os aproveitadores de plantão, que usam da bancarrota da prefeitura como uma forma de se promoverem politicamente, já visando à atuação nas urnas em 2012.

Apesar desse caldeirão que ferve diariamente no mundo online, os jornais e emissoras de TV simplesmente ignoram os apelos da população. É uma espécie de jornalismo às avessas, um formato que não contribui nem para a sociedade e nem para a democracia. Quando os jornais deixam de “ouvir o som das ruas” para se focarem apenas em interesses políticos e comerciais, alguma coisa está muito errada na forma de pensar o jornalismo.

O problema mora, talvez, na falta de ideologia dos meios de comunicações locais. Nos Estados Unidos e na Europa é comum encontrar veículos cuja ideologia política – e não partidos políticos – é a norteadora do noticiário. A partir disso, você tem veículos como a ultra-conservadora Fox News ou o jornal progressista Le Monde, na França. Localmente falando, o que se define – ou não – como pauta são interesses meramente políticos e comerciais. Cidadania? Nada.

A internet ajuda no jornalismo, ao dar voz a todos. Mas seu caráter é ainda anárquico para promover e centralizar mudanças na forma de pensar um jornal no Rio Grande do Norte. É preciso de empresários que pensem o jornalismo como – além de uma forma de ganhar dinheiro – peça importante para a constituição de uma sociedade mais justa e honesta.

E é preciso que o empresariado tenha consciência do papel, utópico, mas ideal que o jornalista deve ter perante à sociedade. O jornalismo é uma forma de serviço público e, não, não vai morrer. E essa ausência de compromisso com a sociedade é um dos elementos que faz com que jornalismo local seja tão fraco ao ponto de, meramente, papagaiar os releases oficiais da prefeitura.

3 comentários:

  • Caro Sávio,
    Você como sempre brilhante. Essa relação insestuosa do poder executivo com a imprensa é impressionante. Mesmo com a internet que, acho, permite uma imprensa mais livre, mas que atinge apenas uma camada da população, o papel do jornalismo independente não tem surtido o efeito desejado na consciencia do população. A prefeita Micarla e sua equipe de trabalho ainda não compreendeu que o Municipio de Natal não dispõe de recursos para atender toda demanda de investimentos de Natal e que tem que conveniar com o Estado e a União para fazer render esses pouco recursos, ou seja, transformá-los em contrapartida de convenios. Assim fez Carlos Eduardo que deixou varios conn~enios em andamento que todos estão paralisados pasmem por falta de recursos para a contrapardita de 10%, enquanto sua equipe gasta com confecção de site mais de R$100 mil quando qualquer boa empresa tupiniquim não cobra mais que uns R$20 mil. E a copa as pessoas precisam ficar sabendo que iremos ficar R$ 300 milhões mais individados. Parabens. Manoel Marques

  • O texto do jornalista Fabio Farias cutuca em um tema que e' um dos tabus caros, a nos potiguares.
    So' discordo quando ele afirma ser o problema, talvez, na falta de ideologia dos meios de comunicacao locais. E' exatamente o contrario, em minha modesta opiniao.
    Analisemos toda a historia de nossa midia local, e veremos o quanto ela sempre defendeu e defende os interesses de classe de nossas oligarquias.
    A classe que vive do trabalho que se dane, nao importa se nos denominemos povo, cidadaos, ou qualquer outro substantivo.
    Fica extremamente dificil concorrer a eleicoes contra os representantes das oligarquias.
    Cito o exemplo das ultimas eleicoes para o senado, no RN. A programacao diaria da TV Tropical foi quase totalmente eleitoreira, em beneficio do senador Ze Agripino Maia.
    Um santo! Que o diga o esquema fraudulento do lixo do Distrito Federal, mantido pelos partidos DEM-PSDB, nos governos anteriores.

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