26.6.12
Postado por
Sávio Hackradt
O julgamento ético e religioso sobre o aborto interfere
no atendimento às mulheres que dão entrada no hospital depois de tentar a
interrupção da gravidez. A avaliação foi feita pela pesquisadora Estela Aquino,
do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (Ufba), com
base em trabalho realizado com 2.562 mulheres em sete hospitais de Salvador,
oito de Recife e quatro de São Luís. "Isso leva as mulheres a procurar
esconder que a interrupção foi voluntária, com medo de serem punidas ou
mal-assistidas", pondera.
Agência Brasil
Segundo a pesquisa, o atendimento nem sempre segue
recomendações de atenção humanizada, indicadas pelo Ministério da Saúde ou pela
Organização Mundial da Saúde (OMS). Exames clínicos também deixam de ser
feitos. "A realização de exame após o procedimento, permitindo a avaliação
do volume e aspecto do sangramento, correspondeu a 64,1% em Salvador e a 65,4%
em Recife, mas foi bem menos frequente em São Luís, que teve 23,3%",
descreve.
De acordo com informações colhidas, "a aferição da
pressão arterial foi muito frequente em Salvador e Recife (respectivamente
80,5% e 88,7%), mas insuficiente em São Luís (31,7%)". A a adequação de
prevenção de complicações infecciosas, quando se considera o controle da
temperatura, foi ainda pior - em Salvador essa medida foi feita antes e depois
do procedimento em 69,8% das mulheres, enquanto em Recife isso ocorreu em 43,8%
daz veses. Em São Luís foi praticamente inexistente, com 4,4%.
Além da falta de procedimentos recomendados, muitas
pacientes não são orientadas adequadamente após a intervenção cirúrgica, o que
pode expor as mulheres a riscos de saúde e de nova gravidez.
"A falta de orientação sobre cuidados pós-alta e o
agendamento de consulta de revisão permitiriam evitar complicações imediatas à
saúde das mulheres, mas sobretudo a falta de orientação e prescrição da
contracepção pós-aborto contribui para a reincidência do aborto, ferindo os
direitos reprodutivos das mulheres", disse Estela.
A pesquisadora da Ufba mostra que a formação dos médicos
"é estritamente clínica" e "voltada ao manejo de complicações
dentro da obstetrícia". O que falta são conteúdos que permitam uma visão
social ampla sobre o aborto. "Mesmo os aspectos bioéticos e legais parecem
ser negligenciados, o que se traduz no desconhecimento dos profissionais sobre
aspectos no exercício da prática clínica. Também desconhecem a importância do
aborto como problema de saúde pública", acrescenta.
A falta de discussão sobre o aborto como problema de saúde
pública pode fazer sobressair um atitude legalista das equipes médicas, reforçada
pelo julgamento moral. Para Estela, o comportamento denunciante tem contradições
éticas. "Os médicos devem respeitar o princípio de sigilo profissional, e
a denúncia contra as mulheres baseada em informações obtidas na prática
profissional viola esse princípio e os direitos humanos das mulheres",
destaca.
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