23.9.12
Postado por
Sávio Hackradt
O jornalismo e a reportagem estão mortos? Esta foi a
pergunta que marcou o debate “Tempo de reportagem e o papel do jornalismo”,
ocorrido na última quinta-feira (20), no Barão de Itararé, em São Paulo.
Audálio Dantas, jornalista e escritor; Ricardo Kotscho, jornalista da TV Record
e autor do blog Balaio do Kotscho; e Natalia Vianna, da Agência Pública.
Por: Felipe Bianchi, no sítio do Barão de Itararé
Eles discutiram a influência da Internet, a crise da mídia
tradicional e o esvaziamento político da profissão no Brasil.
Na opinião de Audálio Dantas, os veículos independentes
exercem um papel fundamental no jornalismo atual. “ A mídia alternativa tem uma
função parecida com a que veículos como Opinião, Movimento, entre outros, tinham
durante a ditadura, ainda que estejamos em um período de democracia”, diz. No
entanto, Dantas ressalta que a realidade democrática ainda não é a ideal: “Às
vezes esquecemos que rádios comunitárias são discriminadas descaradamente, por
exemplo. A sociedade tem que dispor de instrumentos para que trate de defender
seus interesses, que é o direito à comunicação”.
Audálio Dantas, hoje aos 80 anos e membro do Conselho
Consultivo do Barão de Itararé, presidiu o Sindicato dos Jornalistas de São
Paulo durante a ditadura militar e também foi deputado federal. “Havia uma luta
cerrada, pela qual dediquei meio mandato parlamentar meu, contra a concessão de
canais de televisão e rádio a parlamentares ou seus laranjas. São concessões
públicas, de propriedade do Estado, usadas indevidamente não só por políticos e
seus interesses paroquiais, mas também usadas indevidamente por grandes grupos
de comunicação”.
Ricardo Kotscho, que também exerceu a profissão de
jornalista sob a vigilância dos censores da ditadura militar, afirma: “Se a
reportagem está morrendo eu não sei, mas nós continuamos vivos, porque nos
fazemos esta pergunta a mais de 30 anos”. O jornalista destaca a importância da
questão do controle da informação pelos donos de grandes veículos no Brasil,
afirmando que “o tema é fundamental para a democracia no país. No entanto,
Kotscho dispara contra a apatia que aflige as redações nos dias de hoje.
“Apesar de vivermos em um período democrático, eu acho que
o controle da informação é maior hoje do que no tempo da censura. Quando eu
trabalhava em uma grande redação, durante a ditadura, nós, jovens repórteres,
tínhamos plena autonomia para elaborarmos pautas, escrever e editar. Hoje, não
há liberdade de pauta, nem liberdade para escrever ou editar. Essa é a grande contradição
que eu vejo no jornalismo atualmente”, diz.
Além de elogiar a carreira de Audálio Dantas e seu livro
Tempo de reportagem – lançado oficialmente durante o debate –, Kotscho destacou
que já não vemos muito mais reportagens como as feitas por Dantas. Ele lembra
que a classe jornalística tem sua parcela de culpa: “Quando os censores saíram
das redações, parece que os jornalistas deixaram de lutar e de enfrentar a
situação. Tem que haver luta nas redações, que não pode se esvaziar”.
O jornalismo após a Internet
Parte de uma nova geração de jornalistas, Natalia Viana
garante que a crise é da indústria da comunicação e não do jornalismo. “Nunca
estive em uma grande redação, mas ao longo de 12 anos consegui fazer
reportagens que tiveram repercussão e foram consideradas boas por muita gente.
Por que isso? Porque o mercado está em uma crise profunda, em grande parte
alavancada pela Internet”, diz.
De acordo com ela, vivemos um momento de renovação do
jornalismo: “A indústria está em crise eu não tenho a menor dó dela. Isto
possibilidade outras formas de se fazer jornalismo crítico. A morte da mídia
tradicional e dos jornais impressos não significam a morte do jornalismo, pelo
contrário”. Em sua avaliação, devemos buscar novas formas de fazer, organizar, experimentar,
financiar e difundir a reportagem. “É isso que fazemos na Agência Pública e que
vem pipocando no Brasil e no mundo”, diz.
O problema, para ela, é que os grandes veículos não querem
abrir mão de seu poder, mas o caso Pinheirinho, diz, é um exemplo de como o
cenário mudou. “A mídia alternativa vem sendo referência do que é informação,
como no caso do Pinheirinho. O caso marcou um momento importante para o
jornalismo. Já houveram muitas desocupações violentas como a do Pinheirinho,
mas isso nunca havia chegado no Jornal Nacional e nas capas do Estadão e da
Folha. A cobertura consistente dos veículos independentes e de cidadãos que
estavam no local forçou que o assunto não fosse ignorado”.
Democratização da comunicação
Audálio Dantas aproveitou a ocasião para falar sobre a
importância da criação de um novo marco regulatório para as comunicações. Ele
apontou a grande concentração dos meios de comunicação como um dos maiores
problemas para a democracia brasileira. “Sempre houve uma oposição muito grande
dos donos dos meios de comunicação em relação a este tema, que é um dos
principais problemas que cerceia a liberdade de expressão no país. Essa
concentração provoca a defesa de interesses de grupos e não do interesse
público”, diz.
O jornalista também critica a apropriação da bandeira da
liberdade expressão pelos grandes conglomerados do setor: “A liberdade de
imprensa é um escudo que os empresários usam toda vez que se ameaça o enorme
poder dos grandes veículos. Na verdade, deviam chamar liberdade de empresa”.
Kotscho endossou a necessidade de democratizar a
comunicação, ressaltando a partidarização da grande mídia brasileira. “A
liberdade de imprensa é um negócio para meia dúzia de famílias que controlam
veículos de comunicação e, pior que isso, estes meios transformaram-se em
verdadeiros partidos”.
Audálio lança livro
Audálio Dantas, cujas reportagens já receberam diversos
prêmios ao longo de sua carreira, aproveitou a ocasião para lançar oficialmente
seu livro Tempo de reportagem (Editora LeYa). A obra compila diversas
reportagens escritas pelo jornalista, incluindo matérias que ainda não haviam
sido publicadas em livros anteriores. Além da íntegra das reportagens, Dantas
conta a história de cada uma das matérias – como foi feita, quais eram as expectativas
sobre os acontecimentos e os resultados da publicação.
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