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Sávio Ximenes Hackradt

28.1.12


O jornalista e sociólogo Ignacio Ramonet, ex-editor do jornal francês Le Monde Diplomatique, defendeu ontem (27) a criação e o fortalecimento de comissões da verdade para que os crimes cometidos por ditaduras não sejam esquecidos nem repetidos. Ramonet definiu o direito à memória como um novo direito humano, que precisa ser respeitado e garantido às vítimas e à sociedade.

Luana Lourenço, Agência Brasil

“O relato do sofrimento e da resistência é indispensável para que novas gerações conheçam melhor o que se passou. Para que a memória não se degrade, é necessário que seja exercida em relação direta com o presente. É a única maneira de evitar a impunidade e de evitar que o horror se repita”, disse o espanhol, que atualmente coordena a Associação Memórias das Lutas, com sede na França.

Ramonet participou do debate Direitos Humanos, Memória e Justiça, numa sessão especial do Fórum Social Temático (FST) e do Fórum Mundial de Educação, que ocorrem em Porto Alegre.

Para o sociólogo, o reconhecimento da memória tem que ir além de reparações individuais às vítimas e às famílias de vítimas e precisa tornar públicos os horrores praticados pelas ditaduras. Ramonet defendeu a criação de instrumentos que permitam que toda a sociedade tenha acesso ao que ocorreu, como a construção de monumentos, museus e e criação de datas nacionais de homenagem às vítimas.


“O que está em jogo é o direito das vítimas a uma reparação moral e o direito coletivo
à memoria, a poder estabelecer oficialmente que a ditadura foi uma abominação e que a impunidade é insuportável, a poder denunciá-la e proclamá-la em museus, nos manuais escolares ou em dias de memória coletiva como o de hoje”, disse, em referência ao Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, que se comemora nesta sexta-feira.

Ao contrário das leis de anistia, que, segundo Ramonet, estimulam uma espécie de “amnésia coletiva” em relação às ditaduras, as comissões da verdade devem investigar e relembrar as violências praticadas durante os períodos antidemocráticos. “A verdade é uma resposta essencial para as vítimas e os sofrimentos devem ser reconhecidos publicamente. É preciso saber em que condições se violaram os direitos humanos dessas pessoas e quais foram as razões que conduziram os torturadores a fazer o que fizeram para que tenhamos uma ideia do que não se pode repetir”, avaliou.

Segundo Ramonet, entre 1977 e 2011, mais de 30 comissões de verdade foram criadas em vários países, principalmente nos últimos dez anos. No Brasil, a instalação da Comissão da Verdade ainda não tem data definida para acontecer. A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse que o governo está preparando o terreno para o início dos trabalhos.

“A comissão foi aprovada e sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, que está fazendo a escolha dos nomes que vão compor o grupo. E, ao mesmo tempo, estamos organizando o sistema de funcionamento, porque vamos ter que oferecer à comissão lastro de trabalho, arquivos, abertura. Tudo o que estiver relacionado ao período da ditadura militar precisa estar acessível. Não tenho previsão para dar [sobre a data da instalação], mas temos a expectativa de que seja breve e já estamos trabalhando para isso”
Ramonet aproveitou o debate para fazer uma defesa aguerrida do juiz espanhol Baltasar Garzón, que está sendo julgado na Espanha esta semana por investigar os crimes do ditador Francisco Franco, que governou o país por quase 40 anos.

Garzón ficou famoso por liderar o processo que levou à condenação do ditador chileno Augusto Pinochet. Por causa das acusações que tem sofrido, lideradas pelo partido fascista Falange e pelo grupo de extrema direita Mãos Limpas, Garzón está afastado da Audiência Nacional (equivalente ao Supremo Tribunal Federal) desde maio de 2010.

Se condenado, o magistrado pode ficar 20 anos sem exercer suas funções. “Seria uma vergonha. Garzón é um incorruptível, tem demonstrado ser um juiz competente, por isso tem sido perseguido. Por que a Justiça espanhola, que tanto fez para reprimir crimes de lesa-humanidade hoje para cercear Baltasar Garzón, que hoje simboliza essa luta?”, perguntou o sociólogo.

O ciclo de debates Direitos Humanos, Memória e Justiça, que já passou pelo Rio de Janeiro, São Paulo e ontem por Porto Alegre, terá uma edição em Brasília no dia 5 de março.

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