1.1.12
Postado por
Sávio Hackradt
O
New York Times volta a falar do lugar que a palavra “ocupar” [#Occupy] passou a
ter nos movimentos sociais que se multiplicaram esse ano em todo o planeta. E
propõe que se colha a oportunidade para “ocupar a linguagem” e refletir sobre
como damos nomes às coisas e às pessoas – em especial aos estrangeiros.
Em
outubro passado, parti de San Francisco, sobrevoando os portos da costa oeste
dos EUA paralisados pelo movimento Occupy Oakland, antes de chegar à Alemanha,
em meio aos tumultos provocados por Occupy Berlin. Hoje, só resta constatar que
o movimento Occupy transformou, não só o espaço público, mas, também
transformou o discurso público.
*Tradução: Coletivo de tradutores Vila Vudu
Por
Samy Alim, New York Times*
Occupy[1]. Hoje, já é praticamente
impossível ouvir essa palavra, sem pensar nos militantes instalados nas praças
e ruas do mundo.
Até
o célebre lexicógrafo Ben Zimmer estima que Occupy tem grandes chances de ser
escolhida “a palavra do ano” pela American Dialect Society. O vocábulo já
conseguiu modificar os termos do debate, tirando de cena “teto de
endividamento” e “crise orçamentária”, substituídos por “desigualdade” e
“ganância”.
A ironia da palavra “ocupar”, para designar uma corrente social
progressista que visa a redefinir o debate em torno das noções de equidade e
democracia, certamente está bem visível. Afinal, na linguagem corrente, só
países, exércitos, polícias, “ocupam” territórios, praticamente sempre pela
força. Sobre isso, aliás, os EUA nada têm a aprender.
E
em apenas poucos meses, o movimento Occupy mudou completamente o significado da
palavra “ocupação”. Até setembro, “ocupar” significava operação militar. Hoje,
“ocupar” é sinônimo de luta política progressista [e quem, no ocidente, queira
falar do que Israel faz na Palestina, ficam com a tarefa revolucionária de
buscar, ou de inventar, palavras mais adequadas para o que Israel faz na
Palestina: invasão pela força, com violência, ilegal, contra a razão
democrática e civilizada do mundo (NTs)].
Hoje,
“Ocupar” é denunciar injustiças, desigualdades, abusos de poder. E em nenhum
caso se trata de apenas impor-se num espaço: hoje, ocupar significa também
transformar os espaços. Nesse sentido, o movimento Occupy Wall Street ocupa
literalmente a língua, e é hoje autor [não proprietário (NTs)] da palavra
OCUPAR!
A
primeira vez que a palavra “ocupar” apareceu em inglês, associada a
manifestações sociais, remonta aos anos 1920s, quando operários italianos
decidiram ocupar as fábricas em que trabalhavam, até que suas reivindicações
fossem satisfeitas. Já foi uso muito distante da origem da palavra. O
Dicionário Oxford English ensina que, na origem, “occupy” significou “ter uma
relação sexual”. Hoje, a mesma palavra, já ressignificada, serve para preencher
[ocupar?] muitos vazios gramaticais do discurso.
E se mudássemos mais uma vez
o significado da palavra “ocupar”? Mais exatamente, e se pensássemos no
“discurso do movimento Occupy” não mais como discurso dos militantes de Occupy,
mas como movimento total, ele todo, de Ocupar a Linguagem? E o que desejariam
esses “ocupantes da linguagem”?
“Occupy
a Linguagem” [ing. Occupy Language] bem poderia inspirar-se, ao mesmo tempo, no
movimento Occupy – que nos faz lembrar que as palavras sempre significam e que
a língua não é estática, fechada – e dos movimentos locais que contestam os
usos locais da linguagem e fazem lembrar que a língua pode ser tanto ferramenta
de libertação quanto ferramenta de opressão; tão potente para unir, quanto para
segregar.
O movimento portanto poderia começar por refletir sobre ele mesmo.
Em recente entrevista, Julian Padilla, do People of Colour Working Group [Grupo
de Trabalho das Pessoas de Cores], convocava os militantes a examinar as
próprias escolhas lexicais: “Ocupar significa tomar posse de um espaço, e acho
que ver um grupo de militantes anticapitalismo tomar posse do espaço na Rua do
Muro [ing. Wall Street] é um símbolo muito potente. Mas gostaria que eles se
dessem conta da história dos povos nativos, dos peles vermelhas e dos peles
negras e dos pele amarela do imperialismo em todo o mundo. E que passassem a
chamar o próprio movimento de “Descolonizar a Rua do Muro” [orig. fr.
“Décoloniser Wall Street”].
Ocupar
um espaço não é necessariamente ação negativa. Tudo depende de o que se faz,
como e por quê. Quando os colonizadores brancos ocupam um país, eles não vêm
para ficar, vêm de passagem, vêm para pilhar e destruir. Quando descendentes de
tribos nativas dos EUA ocupam Alcatraz (entre 1969 e 1971), é ato de contestação.”
O
movimento “Occupy Language” também poderia fazer campanha para impedir que os
veículos de mídia continuem a usar o adjetivo “ilegal” aplicado a imigrados sem
documentos. Os que defendem essa causa explicam que o adjetivo illegal em
inglês [em português do Brasil, em termos jurídicos precisos, TAMBÉM (NTs)], só
se aplica a ações e objetos inanimados. Usar o termo “os ilegais” [ing.
illegals; fr. les illégaux) aplicado a pessoas, opera portanto, em primeiro
lugar, a des-humanização das pessoas às quais se aplica.
Mas o New York Times
só recomenda aos seus jornalistas que evitem as expressões “estrangeiro ilegal”
[ing. illegal alien; fr. étranger illégal] ou “estrangeiro sem documentos”
[ing. undocumented alien; fr. sans-papiers]. O New York Times nada diz sobre não
usar a palavra “os ilegais” [ing. illegals].
==========================================
[1] A palavra Occupy [nas
redes sociais, sempre #Occupy] é, sim, um belo achado, uma bela invenção
internacionalista, dos muitos que se dizem, nós-vós-vóz-de-nós-mesmos:
“ocupai/ocupar/ocupemos!”
Em português, há aí também um traço performativo de
palavra-de-ordem: “Ocupai!” – modo imperativo, 2ª pess. do plural, do verbo
ocupar, como “falai!”, “cantai!”, “sentai!”, “andai!”, “marchai!”,
“manifestai!”, “ocupai e não arrasteis o pé daí, nós-vós-vóz-de-nós-mesmos, os
99%”. Em inglês, há aí, o traço declarativo (tb performativo, portanto) do
infinitivo (“ocupar”) que ecoa, também para os bilíngues, com inglês, em
todo o mundo [NTs].
*Tradução: Coletivo de tradutores Vila Vudu
Estação Música Total
Últimas do Twitter
Arquivo
-
▼
2012
(1376)
-
▼
janeiro
(163)
- Gramsci e o sono dos empresários do RN
- África: não basta cantar “We are the world”
- Brasil ainda pode ter 50 mil em condições de escra...
- Governo que duplicar multa toda vez que motorista ...
- Cinema brasileiro perdeu bilheteria em 2011
- Pressão arterial deve ser medida nos dois braços, ...
- O pra sempre que geralmente acaba
- Davos: América Latina é um "oásis" de estabilidade...
- Fórum Social Temático termina em Porto Alegre com ...
- Lei Geral da Copa recebe críticas por restringir c...
- Mauro Santayana: A vingança dos dinossauros
- Paulo Vanzolini e a sabedoria do boêmio
- Segundo país do mundo em casos de hanseníase, Bras...
- Carta do Henfil
- Maria do Rosário: PEC do Trabalho Escravo é priori...
- A crise do poder judiciário ou há crise no poder j...
- Receita publicará regras de ajuste da declaração d...
- Luxo, fuga e prisão do Madoff mineiro
- Impossível decifrá-las
- FBI quer monitorar Twitter, Facebook e demais rede...
- Ignacio Ramonet defende comissões da verdade e mem...
- Crédito habitacional cresceu 44,5% no ano passado
- FST: A crise da esquerda e a mula sem cabeça
- Brasileiros são os que mais usam emagrecedores na ...
- Nossos avós não são mais os mesmos
- Superávit primário do Governo Central bate recorde...
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVEL...
- Escândalo de corrupção abala Vaticano
- Gil defende importância da internet para movimento...
- MP denuncia juízes que venderam sala de associação...
- Indústria, varejo e centrais sindicais se unem con...
- Vale recebe o título de pior empresa do mundo
- Vem aí a IIª Edição do Amigo Culto
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVEL...
- Mulheres são as mais atingidas pela crise econômic...
- Projeto Bote Fé Natal
- Mulheres na política é tema de concurso do Mercosul
- Quadro da obesidade no país é "mau sob todos os as...
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVEL...
- CNJ teve aval do Banco Central para acessar dados
- O boom das microfranquias
- Brasil é pioneiro no uso de biocombustível na Antá...
- Britânica faz primeira travessia feminina solitári...
- Cineastas brasileiros podem inscrever trabalhos no...
- Bezerra confirma que Dnocs terá mudanças na diretoria
- Hoje é o Dia do Carteiro
- Íntegra da sentença da Operação Impacto
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVEL...
- 53% da população mundial afirmam estar acima do pe...
- “Voto não tem preço, tem consequências”
- A jovem arte de fazer política
- PMDB impede Bezerra de demitir diretor de estatal
- Mundo precisa gerar mais de 600 milhões de emprego...
- Justiça Militar absolve sargento gay de crime de i...
- Imagens e textos reforçam direito à liberdade reli...
- Supersalários de magistrados no Rio variam de R$40...
- A inquietude do meu ser...
- Novo Código de Processo Civil deve ser votado na C...
- Rita Lee anuncia ‘aposentadoria de shows’
- Movimento nacional pede penas mais severas para qu...
- Gramsci e o Rio Grande do Norte
- Fórum Social Temático vai discutir crise financeir...
- Elis Regina, Dom Helder e uma carta para um preso ...
- Brasil tem 58 milhões de acessos à banda larga
- Contribua com a Biblioteca Social Muncial doando u...
- Instituto alerta para abusos na lista de material ...
- Pequenas empresas crescem com e-commerce e já fatu...
- Psiquiatra aponta prescrição indiscriminada de ans...
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: Cartas de Cotovel...
- Dilma mexe no Dncos, estatal com denúncias de desv...
- Congresso americano adia votação de projetos de le...
- TV por assinatura está presente em quase 13 milhõe...
- Reino Unido condena três muçulmanos por pregar ódi...
- Copa da Rússia em 2018 está mais adiantada que o B...
- Globo de Ouro: viva a diversidade
- Investimento em publicidade cresceu 16% no ano pas...
- Sistema socioeducativo para jovens infratores est...
- Capitalismo de Estado brasileiro é ambíguo, diz Ec...
- Brasil é segundo país mais desigual do G20, aponta...
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVEL...
- Brasileiro crê que 2012 será melhor do que 2011, m...
- Presidente de associação de juízes defende que só ...
- Mais de 40 milhões se prostituem no mundo, diz estudo
- Unesco, Brasil e Estados Unidos lançam projeto par...
- Brasil: saúde pesa mais no bolso do cidadão do que...
- Cientistas falam sobre procedimentos em caso de 'c...
- A compaixão empresarial
- Estudo do Ipea mostra melhoria na situação das fam...
- Facebook passa Orkut e torna-se a rede mais acessa...
- Brasil terá de importar mais gasolina este ano
- BNDES abre inscrições para financiar setor audiovi...
- Carlos Roberto de Miranda Gomes: CARTAS DE COTOVELO
- 3º Fórum de Midia Livre mobiliza comunicação rumo ...
- Uruguai assumirá culpa por crimes da ditadura
- Centrais sindicais fazem ato contra juros altos na...
- Debates da Rio+20 devem destacar economia verde co...
- Ainda o livro. Qual o seu futuro?
- Teresa que amava Raimundo que não sabe amar ninguém
- ESCADARIA - Dominguinhos & Yamandu Costa
- Diante da lei
-
▼
janeiro
(163)
0 comentários: