9.2.12
Postado por
Sávio Hackradt
Os
recentes confrontos nos países árabes serviram de impulso para as mulheres
começarem a lutar pelos seus direitos. Em vários países, elas foram às ruas
clamar por mudanças. Até que ponto elas estão vencendo esta luta?
Por
Martina Sabra (Brasil)*
Mais
de um ano após o início dos movimentos por mais democracia nos países árabes,
os homens parecem continuar dominando, pelo menos na política: é o que indicam
os novos governos da Tunísia ou do recém-votado parlamento egípcio.
No
Egito, apenas 2% dos representantes do povo são mulheres, embora o país tenha
ratificado em 1981 a Convenção das Nações Unidas para Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra as Mulheres e concordado em aumentar a cota de
mulheres no setor político, de acordo com o proposto nas metas do milênio.
Neste
contexto, não devemos esquecer que a responsável pelo começo da revolução no
Egito foi uma mulher. Em 2011, a blogueira Asma Mahfouz usou o Facebook para
convocar a população a transformar o feriado egípcio de 25 de janeiro em dia de
manifestações contra a ditadura no país.
Tunísia
reformula leis desfavoráveis a mulheres
Na
história recente dos países árabes, as mulheres sempre foram às ruas protestar
quando o assunto é de interesse nacional. Na Tunísia, organizações de mulheres
se manifestaram nos anos 1940 contra o poder colonial francês. No Egito, Hoda
Shaarawi arrancou em público seu véu da cabeça, em 1923, em sua luta pela
emancipação das mulheres e contra a ocupação britânica.
Do
ponto de vista árabe, a participação feminina nas manifestações públicas em
2011 não foi novidade. Também não é novidade o aumento de jovens e mulheres
árabes na internet. Nos países árabes, moças "decentes" não saem de
casa quando têm tempo livre, mas ficam em casa com suas famílias. Twitter,
blogs e afins oferecem, então, a chance de elas se comunicarem com o mundo
exterior. O número de mulheres jovens que fazem uso destas ferramentas virtuais
nos países árabes está aumentando.
Presas
em casas, livres na internet
O
que surpreendeu nos últimos anos foi a determinação e a eficiência com que
muitas mulheres organizaram as manifestações. Não usaram somente da internet,
mas também foram às ruas, de porta em porta buscar apoio.
No
Cairo e em Túnis, mulheres de pé, nas ruas, com suas bolsas debaixo dos braços,
gritaram palavras de ordem contra o regime, até os vizinhos saírem de suas
casas e aderirem à manifestação. Estas mulheres não somente trabalharam nos
bastidores das manifestações, cuidando da logística das atividades de protesto,
como também marcharam à frente dos grupos, incitando a grande massa.
Impressionante
foi também a forma como homens e mulheres integrantes da revolução no Egito se
respeitaram e lidaram uns com os outros. Os tabus e as proibições de costume
não receberam importância naquela altura, até porque todos lutavam pela mesma
causa: a transparência no país e o tratamento das vítimas da repressão contra
os manifestantes.
Outra
surpresa no que se refere à participação das mulheres nas revoluções árabes foi
a firmeza com que elas se opuseram à violência sexual, sozinhas ou em grupo.
Tanto na Tunísia quanto no Egito, homens integrantes das forças de segurança
tentaram humilhar as manifestantes, ao passar a mão entre suas pernas ou seios,
para forçá-las a abandonar o protesto.
Mulheres
vão às urnas no Egito
No
Egito, mulheres manifestantes detidas pela polícia foram obrigadas a passar por
uma espécie de "teste de virgindade". As consultas ginecológicas
obrigatórias aconteceram, em parte, na presença de policiais, o que foi
percebido pelas vítimas como estupro. Muitas dessas mulheres não tiveram
coragem de se opor às autoridades por vergonha ou por medo de suas famílias.
Porém
uma delas recorreu à Justiça e venceu. Samira Ibrahim, de 25 anos, conseguiu em
dezembro de 2011 que os "testes de virgindade" à força fossem
proibidos. Fato que fez com que milhares de mulheres fossem às ruas do Cairo
protestar contra o conselho militar.
Mudanças
visíveis
A
autoconfiança das jovens mulheres árabes é um indício para as profundas
mudanças que ocorrem nas sociedades do Norte da África e do Oriente Médio.
Também estruturas familiares estão mudando. Nos países do noroeste da África, a
taxa de fecundidade caiu pela metade nos últimos 20 anos. No Oriente Médio, o
ritmo é mais lento, mesmo registrando menos nascimentos. Em diversas cidades
grandes, se tornou comum as famílias terem em média apenas dois filhos.
Com
estas mudanças, as mulheres vêm exigindo também outros tipos de liberdade,
como, por exemplo, as relacionadas à vida pública. Porém neste quesito ainda
esbarram em uma sociedade patriarcal, uma tendência intensificada com o avanço
dos partidos islâmicos e dos movimentos islâmicos conservadores.
Os
defensores deste tipo de ideologia pregam, por um lado, a superioridade moral
do islamismo e, por outro, a obrigatoriedade das mulheres de obedecer.
Defendem, por exemplo, que mulheres não devem desempenhar certos cargos
públicos porque seriam emotivas demais.
A
reforma das leis
Outro
problema são as discriminatórias leis contra as mulheres vigentes em quase
todos os países árabes, sobretudo referentes aos direitos relacionados ao
casamento, divórcio e herança. Na maioria dos países árabes, estas leis são
extremamente conservadoras, baseadas no islã.
Além
destes, também o direito penal é carente de reformulação. Com exceção da
Tunísia, os países árabes proíbem veementemente o aborto. O que resulta
anualmente na morte de muitas mulheres que buscam o aborto ilegal.
A
Tunísia e o Marrocos já mostraram, porém, que no âmbito do direito islâmico é
possível reformular algumas leis que antes desfavoreciam as mulheres. Mas,
ainda assim, muitas mulheres continuam com problemas nestes países porque
juízes conservadores se negam a fazer valer as leis reformuladas. Somente no
Cairo, centenas de milhares de mulheres não têm certidão de nascimento ou
carteira de identidade.
*Fonte: Deustche
Welle, por Martina Sabra
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