7.1.12
Postado por
Sávio Hackradt
A
entrevista é antiga mas vale a pena reproduzir. A poeta fluminense Bruna Beber,
jovem, de Duque de Caxias (RJ), e que adotou São Paulo para morar,
falou ao Portal Literal, desde a paparicagem em torno de seu nome, até
poesia e arte. Autora dos livros A fila sem fim dos demônios descontentes
(7Letras, 2006) e os Balés (Língua Geral, 2009). Em 2008 venceu o 2º Prêmio
Quem Acontece, na categoria revelação literária. O portal Vermelho reproduz
aqui trechos daquela entrevista (José Carlos Ruy).
Bruna Beber |
Ganhando
o mundo:
Saí
das casas dos meus pais, mudei de cidade e de estado. Mas já saí do Rio pra São
Paulo com o Balés na mala, comecei a escrevê-lo no comecinho desde 2007. E aí
convivi com ele aqui esse tempo todo até finalmente lançá-lo.
Mudei
bastante o livro nesse tempo, entrei num processo esquisitofrênico de gravar
poema por poema e ouvir o conjunto e cada um em sua solteirice. E no meio dessa
falação descobri que o Balés era um livro muito musical. Então o reescrevi inteiro,
a mão e à máquina. E passei muitas dezenas de dias numerando e catalogando
várias formas diferentes de dispor os poemas.
Até
que cheguei a uma seleção de três para escolher uma só, a final. E aí entra o
momento em que você põe de lado toda técnica e maluquice aplicada pra sentir o
que verdadeiramente deve ser feito. Ele virou o extremoposto do resultado que
julguei final um dia.
Perguntada
sobre as influências que recebeu (Maiakovsky, Rô Rô, Graciliano, Neil Young,
Nara, Cage), diz:
Explicitamente
acho que só o Benito di Paula, o Nicanor Parra e o Último tango em Paris, que é
um filme que nem gosto tanto, mas vazou. Risos. Mas, implicitamente, acho que
um conjunto muito extenso de sensações que só uma grande mudança pode provocar.
.........................
Quando
o entrevistador compara sua poesia com a coloquialidade de Manuel Bandeira, ela
não se intimida:
O
autor do poema "Alumbramento", escrito em 1913. Está no livro
Carnaval e me tocou como poucos poemas até hoje. Antes de Carnaval só tinha
lido Libertinagem e Estrela da Manhã, duma edição dupla pequenininha que
ganhei. Acho uma honra que me comparem ao Bandeira pelo que conheço dele e
gosto, mas, honestamente, li pouco sua obra.
...........................
Sobre
ser encarada como "uma das principais referências da novíssima
geração", lembra da avó:
Como
diz minha avó "é, tão dizendo por aí..." e aí ela sempre emenda com
lendas urbanas, teorias científicas não comprovadas e modas que a imprensa
espalha e todas as pessoas começam a adotar, do tipo "adoçante dá
câncer". Ninguém nunca sabe se é verdade, mas todo mundo vai parando de
tomar adoçante. Eu me acho muito nova para ser referência de alguma coisa,
ainda mais na velocidade que as coisas vão.
E
só digo que já posso morrer porque um feitiço que joguei pro mundo no primeiro
livro virou contra mim mesma. No poema "a novíssima literatura", no
qual dizia que a novíssima se preocupava demais em ser estudada, reconhecida
etc. E eu provocava dizendo que as crianças, estudando os novos poetas daqui a
100 anos, estariam entendiadas como eu estive lendo Camões com 13 anos e
fazendo chifrinho nas fotos, pintando os dentes de caneta azul.
E
eis que a Ática e a Scipione lançaram duas antologias que vão na contramão de
que a garotada tá estudando a dita "poesia contemporânea" (conceito
muito amplo rs) Hoje. Inclusive eu! E pra dizer a verdade, acho emocionante ser
lida e discutida enquanto estou viva, e mais ainda por quem tá descobrindo a
poesia, a literatura. Do futuro ninguém sabe nada, continuo não me preocupando
se meus poemas vão "sobreviver".
Outro
dia recebi um e-mail de um menino de 15 que disse ter chegado ao meu livro por
uma das antologias, que o colégio dele adotou. Ele me descreveu as coisas que
ele sentiu lendo os meus poemas, e isso é tão caro pra mim! Quase chorei de
saber que participei do pontapé inicial poético de alguém, fiquei lembrando dos
meus primeiros encontros na leitura. Foi lindo.
Dois
poemas de Bruna Beber
verbo
irregular
pra
sempre é passado
é
mais uma promessa apostando corrida
com
todas as outras
na
escadaria da igreja da penha
voltaria
atrás
de
joelhos
pra
chegar primeiro
no
futuro
porque
se o tempo cura tudo
e
o tal futuro a deus pertence
não
vou duvidar
que
milagres acontecem
mas
pra sempre vou achar
não
quero me especializar
em
ter certezas, em fabricar
situações
definitivas
toda
vez que me vierem à cabeça
seus
lábios de algodão
doce
se dissolvendo
nos
meus.
Neighborhoods
se
o mundo não fosse
esse
aterro de
máquinas
barbas
pilhas
débitos
prazos
e
canetas
marca-texto
medos
dúvidas
e
embalagens
tetrapak
se
o mundo não fosse
um
aterro de babacas
ou
se o mundo não fosse
um
abrangente
e
resumido
aterro
de sinônimos
e
se essa rua
se
essa rua
fosse
tua
eu
ia me mudar pra lá.
Fonte:
Portal Literal
Estação Música Total
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