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Sávio Ximenes Hackradt

20.3.12


“COISAS DA VIDA”

Por Leide Franco* (@LeideFranco)

O amor pela aparência física e suas melhores aparições não vêm de hoje, mas atualmente, talvez, com o auxílio da ditadura da moda se encontre em seu auge.

Não foi à toa que o grego Narciso se apaixonou por si mesmo em profunda sintonia com sua beleza. Como conta a história, era de se admirar e ficar pasmo com tamanha perfeição contida naquele rosto.

Dizem que esse amor platônico por si próprio pelo qual Narciso sofria se acometeu através de uma praga jogada contra ele após ter rejeitado a ninfa Eco, mas eu tenho cá minhas particulares dúvidas. Acho que se enganam quem pensa que ele se encantou pelo seu rosto que se refletia constantemente no espelho de água do lago. Acredito que Narciso estava morrendo de amores por uma pessoa que não era ele, ou seja, uma projeção daquilo que ele gostaria de ser.

Narcisismo, é assim que defino a escravidão pela qual muitos passam, sendo a maioria composta pela ala feminina. Salões de beleza lotados de mulheres querendo se transformar em outras. E eu que queria apenas tirar as pontas, as micro pontinhas dos meus cabelos, precisei esperar umas duas horas pregada naquelas cadeiras da espera pela mudança das cores madeixas, tamanhos e sonhos de mulheres que não querem envelhecer nunca, tornando-se loiras.

Os espelhos que tomavam conta de quase toda aquela sala de beleza eram poucos para a vaidade delas. “É que Narciso acha feio o que não é espelho”, já disse Caetano Veloso. Freud explica: já nascemos todos com um pedaço herdado de Narciso. Uns também se afogam e por pouco não morrem.

Tinha uma morena assim como eu que tinha chegado ao salão às 9h deste sábado, 17. O relógio já marcava 16h e ela lá. Fazendo o quê? Enlourecendo! E eu quieta, na minha morenice, pensava: essa moça vai ser escrava para o resto da sua vida loira, até que uma tintura preta as separe. Pelo que entendi, ela já estava na terceira coloração só neste sábado. Parece que a primeira não deu o tom loiro tipo Angélica que ela tanto queria. Disseram que ficou meio cabelo de boneca, quase branco.

Por outro lado eu refletia: acho que ela vai deixar aqui metade do salário do mês dela, ou ainda está dividindo em suaves 3 prestações a sua nova cabeleira loira que estava ficando meio cinza esverdeado, ou algo assim.

Até que quando vale a pena nos envaidecermos ao ponto de nos transformar em outras pessoas? Mudar, melhorar, sentir-se muito mais bonita é extremamente válido. Eu também de vez em quando acordo com uma vontade mutante, com uma ânsia de na próxima vez que me olhar no espelho, enxergar outra pessoa, mas não tem como. Não será uma cor diferente nos cabelos ou umas mechas claras que vão fazer eu ter a cara e a sensualidade da Angelina Jolie. As mudanças vivem sempre dentro de nós, mas muita gente só as encontra nos salões de beleza e nas caixinhas das tinturas. Mude, mas mude devagar, e de preferência que não seja aos sábados.

*Leide Franco - Comunicadora com pretensões literárias; 
Um pouco de filosofia e reflexões cotidianas; 
Um muito de MPB;
E quase nada do que ainda quero ser.

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