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Sávio Ximenes Hackradt

22.3.11

Eduardo Kuabara, que vive há 19 anos em Tóquio, conta como sua vida mudou com o perigo de um acidente nuclear. E explica por que decidiu continuar no Japão
Lucas Hackradt – Época
Desde o dia 11 de março, quando um tsunami provocado por um terremoto devastou boa parte do norte do Japão, um clima de medo se espalhou pelo país. Pouco tempo após a catástrofe, que já desabrigara e destruíra a vida de milhares de pessoas, as autoridades anunciaram a ocorrência de um acidente em uma grande usina nuclear em Fukushima. Em questão de dias, as preocupações com a destruição deram lugar à preocupação com um possível acidente nuclear. 

A potência tecnológica, terceira maior economia do mundo, se transformou em um país com infraestrutura deficiente, teve sucessivos cortes no abastecimento de energia e água e temia o iminente perigo de que a história tragicamente se repetisse, copiando, ironicamente, um mistura entre a catástrofe que foram as bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki e o desastre na usina nuclear de Chernobyl, em 1986. 

“Na segunda-feira (14) iniciou-se o racionamento de energia elétrica e de gasolina. Em Tóquio e outras províncias, limitou-se o abastecimento a cerca de 5 ou 6 litros, dependendo do local. Muitos trens funcionam em horários irregulares na região central. Por segurança e medo, eu concentro minhas atividades dentro de casa”, disse a ÉPOCA Online o professor da Universidade Católica de Brasília, Miguel Kamiunten. 

A usina de Fukushima Daiichi fica relativamente longe do epicentro do terremoto do dia 11. Ainda assim, o tremor foi forte o suficiente para danificar todos os reatores nucleares. Um deles, o de número 3, começou a liberar radiação e fez com que o governo determinasse um raio de evacuação total de 20 quilômetros. O perigo foi classificado como grau 5 em uma escala que vai só até 7, e até em Tóquio foram registrados níveis maiores de radiação.
Eduardo Kuabara é brasileiro e já vive na capital japonesa há 19 anos. Ele contou que logo quando chegaram as primeiras notícias sobre a situação em Fukushima, todas alarmantes, as pessoas se desesperaram. “Quando explodiu o segundo reator da usina, eu e minha esposa resolvemos
nos juntar a um grupo do meu escritório para fugir para o sul, a mais de 1.500 quilômetros da Linha de Risco (o raio em torno de Fukushima)”, disse. 

Para Eduardo e sua família, o mais difícil foi deixar para trás amigos e parentes. Mas, para ele, a sensação de segurança, mesmo na capital japonesa, já não era sustentável. Ao retornar, dias depois, a Tóquio, Eduardo afirma ter encontrado outra cidade. Uma Tóquio deserta, escura, fria e amedrontadora. "Estão entrando nas casas para levar dinheiro, joias e outras coisas", disse, lembrando que, em situações como essa, pessoas aproveitam para cometer esses tipos de crime.

“Quando voltei a Tóquio, naquele momento, o pânico tomou conta de nós. Por isso decidimos sair da cidade definitivamente”, afirmou.

O pânico de Eduardo, e de tantos outros, é explicado também pela falta de informação consistente fornecida pelas agências do governo. “O vazamento de radioatividade nas usinas e o percentual que poderá chegar em Tóquio é muito pequeno, dizem, porém, como na vida, ficamos ao sabor da direção dos ventos. Hoje, parece que ele sopra em direção ao mar”, disse o professor Miguel, confirmando o tipo de informação que chega para os japoneses. 

“Parece até que estamos em uma guerra. Temos que pensar com o medo e a braveza ao mesmo tempo”, afirmou Eduardo ao comentar o clima no país. Segundo ele, o próprio governo japonês e a empresa Tokyo Electric Power (Tepco) esconderam muitas informações sobre a real gravidade do acidente nuclear. 

Sem poder confiar muito no que lhes é repassado, Eduardo e sua família temem por sua própria segurança o tempo todo, mesmo longe de Tóquio. “Não fiquei sossegado nem depois que chegamos ao local (para o qual fugiram, ao sul). Ainda sentia muita angústia”, disse. 

“Confesso que ainda estou assustado e não sei se acompanhar as notícias minuto à minuto serve para estar alerta ou assustar mais ainda”, afirmou também Miguel. 

Mesmo assim, Eduardo e Miguel planejam continuar firmes em terras japonesas, com perigo ou sem perigo. “Meus familiares no Brasil pedem para eu voltar, mas por ter negócios e família no Japão, resolvi ficar e conviver com o medo”, afirmou Eduardo. Ele considera “loucura” voltar ao Brasil depois de quase duas décadas no Japão. Para ele, foi a terra que lhe deu trabalho e uma oportunidade boa de vida, e isso não há como largar. 

“E mesmo que nós quiséssemos sair do Japão, não conseguiríamos, porque há multidões nos aeroportos tentando sair do país”, afirmou. Multidões que, assim como Eduardo, estão assustadas e temem pelo pior; estrangeiros e japoneses que se viram sem outra saída que não largar tudo o que construíram na espera de se salvarem de um possível acidente nuclear que ameaça ser pior que o de Chernobyl.

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